A SENHORA COM A MUDA DE FLOR
Observei a senhora que esperava o ônibus em frente ao supermercado. Ao seu lado no chão uma sacola de plástico e dentro dela uma muda de fina planta carregada de flores amarelas. Vi a alegria estampada no rosto da velhinha, quando olhava para a sacola , como a criança quando encontra algo que sempre quis e corre para casa.
Ganhou de alguma amiga, visto que estava com as raízes expostas e ainda recoberta com restos de terra.
Tive a certeza que a felicidade pode estar em qualquer coisa. Naquilo que não tem importância, mas sem mais nem porque é tudo o que o outro poderia desejar. E nessas horas o valor material pouca diz, afinal qual é o valor daquilo que muito se quer?
Os preços de tudo o que existe, e tudo o que existe tem preço, não passam de convenção que se instituiu para premiar aquele que produz. Um estímulo para que ele continue produzindo. Uma forma objetiva para dar valor a coisas que tem valores subjetivos. E é dificultoso colocar preço no que gera interesses diferentes nas pessoas.
Chegou o ônibus, a senhora pegou a sacola com cuidado, sentou-se no banco da frente e acomodou-a em seu colo como quem acalenta um recém-nascido.
Imagino que ela tenha ido a viagem toda pensando na planta. Que seria melhor deixá-la dentro de um frasco com água fresca por alguns dias para que enraizasse bem. O que certamente garantiria mais sorte em sua brotação, afinal estamos em plena primavera, período bastante favorável para o transplante de margaridas, crisântemos, malmequeres e todo o tipo de asteraceaes.
Enquanto isso pensaria num local especial para plantá-la. Cavaria uma cova generosa, afofaria o solo revirando a terra por completo. Certamente era mulher de habilidades no cultivo.
Sentaria uns punhados de substrato bem gordo na cova para que a planta se desenvolvesse viçosa e tivesse do que se alimentar. Buscaria uma jarra com água, que decerto não teria um regador em casa e molharia o solo, hidratando a nova companheira. Cravaria uma estaca bem ao lado e amarraria à um barbante para sustentá-la até que ganhasse forças e começasse sua brotação.
Caminharia de volta para a cozinha e antes de entrar daria uma última olhada para conferir se o lugar era o adequado e o quanto a planta embelezaria o pequeno jardim quando renovasse sua floração.
Sentia-se feliz. Era o necessário para manter-se feliz.
Certa vez ouvi alguém dizer que a nossa felicidade nasce das pequenas coisas que fazemos em nosso dia a dia. Aquilo que nós faz sorrir e sertir-se criança novamente. Que nos mostra que em grande parte de nossas vidas corremos na direção errada buscando o que , em verdade, pouco nos traz de bom e quando traz é por um tempo efêmero e superficial logo transformando-se em frustração e arrependimento.
Ainda corremos atrás das coisas erradas numa desenfreada loucura sem perceber que sob nossos pés pisoteamos canteiros e mais canteiros de flores amarelas.
A senhora teve olhos para vê-la.