Diário de minhas andanças
(26/11/2011)

Então,é sábado...
Canta um sabiá no meu quintal. Arrasta pela tarde quieta a cantilena do acasalamento.
Uma cantiga doce,quase nostálgica,dizendo entre as poucas amoras que ainda restam ,do infinito de seu “amor passarinho” por aquela que choca ovos num galho qualquer.
Entrego-me à magia dos gorjeios enquanto executo algumas tarefas que ficaram pendentes. Mentalmente vou fazendo um balancete de minha semana. Frustrações,sentimentalismos,pieguices...Sonhos,tentativas,emoções...
Alegra-me o resultado com saldo positivo a meu favor.
Frank,meu cachorro de estimação,aproxima-se.Faz um alongamento ,olha-me com aquêle seu olhar cachorresco e dá uma tremenda bocejada.
Bocejo também e vejo meu trabalho perder-se na preguiçeira da tarde.
Afinal, é sábado !
[ E...Canta um sabiá no meu quintal ]
Vêm-me à lembrança uma tarde de um sábado ao final dos anos sessenta. Era dezembro e pela rua ladeada de gabirobeiras , alguns amigos teciam sonhos de adolescência.
O vento que soprava era suave,e tanto,que mais apropriado seria denominar-lhe brisa. O ar confundia-se com aquêle cheiro de bolo de fim de semana e,numa janela,a moça delineava no olhar as paralelas da linha férrea.

A brisa entretia-se : Na ida, bolinando seus cabelos.Na vinda,roçando docemente o tecido da cortina naquela sua face de flor.
Num gesto delicado ela ajeitava os cabelos e a canção que rolava em vinil na sua sala era “Melody Fair”,com Bee Gees.
Linda e calada,ela divagava nas notas como a esperar por um trem ilusório que haveria de chegar, rompendo os contornos da primeira curva à sua frente. Gorjeavam sabiás pelo trajeto e,ao longo da rua,amores platônicos,desajeitados,no uso de suas melhores poses pisavam a calçada de pedras.
Em pensamentos...
[ A moça da janela era amada !!!  ]
No entanto,aos deslumbrados andantes, faltara firmeza para seguir o exemplo dos sabiás. Se à estes sempre coube a ousadia das cantigas do acasalamento,àqueles tão somente a timidez e a covardia do platonismo . Assim,feito andarilhos,seguiram carregando o peso das trouxas ,pisoteando as sombras de seus mais dourados sonhos.
A bela da tarde, nem percebera que o vagão por ela esperado, eram eles quem o arrastava.
Agora,êste sabiá no meu quintal...
Feliz,cantante,acasalando...
Faz-me pensar naqueles desajeitados. Se, tal como eu o ouvissem, certamente retomariam aquela tarde de sábado cheirando à bolo de fim de semana, a moça da janela,cabelos ao vento,Bee Gees na vitrola,um trem apitando na curva,uma estação...
Imagens do etéreo,que o pássaro cantor faz agora questão de reviver. Ah!...Estes sábados...
Ah!...Este sabiá...


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https://www.youtube.com/watch?v=34wjlmNNuMQ

Joel Gomes  Teixeira

joelgomesteixeira@hotmail.com