Rosa Choque

- NÃO SENTA AÍ, MOÇA!

- O quê?

- Aí tá molhado.

- Ah, ok. Obrigada.

Respondi e sentei ao lado dela. Todo mundo que entrava no ônibus ela dizia a mesma coisa.

- Acredita que eu sentei, mulher? O pessoal de trás sabia que estava molhado e ficaram em silencio esperando eu me sentar para rirem de mim, acredita?

Eu acreditava nela, mas não havia dormido bem noite passada e estava um pouco estressada para conversar.

- ah, uhum.

- Pois é, tu acha que pode? Tem gente ruim em todo lugar...

Eu sabia que querendo ou não, aquela senhora ia conversar comigo o trajeto inteiro. Resolvi então deixar o estresse de lado e oferecer minha total atenção ao seu desabafo. Conversamos. Ela disse que estava toda arrumada para visitar o filho que mora nas Pedrinhas (Bairro da cidade Picos).

- A senhora vai descer onde?

- Ali na igrejinha. Sabe qual é?

- A azul?

- Não sei se é azul, acho que sim.

- A que é perto da fábrica de iogurte?

- Isso! Essa mesma.

- Pronto! Eu aviso quando estivermos perto...

- Ótimo! Porque eu não tô vendo nada com esses vidros dessa porcaria de ônibus!

Ela queria mesmo reclamar.

- Então a senhora está indo visitar seu filho?

Ela logo percebendo meu interesse, abriu um leve sorriso e contou mais sobre. Estava mesmo toda arrumada, de calça jeans rosa choque, jaleco (para se proteger do sol), uma blusa cinza por baixo e um leve batom também rosa nos finos lábios. Apesar do incidente com a poltrona molhada, ela não me disse, mas estava feliz! Seus olhos escuros e vivos marejavam quando falava do filho dedicado que ligou para ir pegá-la em casa, mas ela por não querer dar trabalho foi de ônibus mesmo. Conversa vai, conversa vem... Chegamos na igrejinha azul.

Para os outros passageiros, desceu uma senhora ranzinza de calça rosa choque com o ‘fundo’ todo molhado.

Para mim, desceu uma mãe amorosa que não mede esforços para estar com seu filho.