Um dia do caçador e o outro também
De que lado Deus está?
Somos um comercio ambulante. Tudo se compra tudo se vende. Nesse colossal universo de negócios e negociatas, não há pudores, não há ética, apenas uma famigerada sede de ganhos.
Batistelo Benedito Santana da Silva, não tinha só a cabeça grande, também os olhos e uma ganância de poucos. “Que se dane minha pobreza, vou ser rico e famoso” Pensava olhando os ratos passearem na frente do seu barraco, a mãe só não estava grávida quando paria, era tanto filho que em certa ocasião, passou a doá-los como balas em festa infantil. Batistelo então com doze anos, tinha Silvio Santos como ídolo, assistia seus programas na televisão do Bar do Caláu, em troca lavava os copos e varria o chão.
— Meu nome agora é Roberto dos Santos! – Proclamou-se, vestindo o terno que roubara do vizinho ir ao culto.
O pai dele era um ilustre “pé-de-cana” viciado em crack. A mãe dizia amém, Tudo que viesse era lucro, analfabeta e também drogada, mas ainda tinha uma bunda saliente que podia dar crédito. O negociante Roberto dos Santos surrupiou a bicicleta do vizinho. O infeliz acreditava piamente que tudo na vida era por vontade de Deus, Mas sem o terno e a bicicleta, estava muito furioso.
— Puta que o pariu meu Deus! O senhor vai deixar o demônio tirar tudo de mim? Que porra é essa? Se minha bicicleta não aparecer eu deixo a Bíblia e entro para o crime!
Roberto trocou a bicicleta num relógio, vendeu o relógio, comprou um violão e uns óculos escuros, colocou no olho e foi à praça com uma cuia de esmolas, dizendo que era cego. Não sabia dedilhar uma só nota, mas batia os dedos nas cordas e pedia dinheiro, clamando por amor de Deus.
— Ajude ai meu povo! Ajude esse menino cego e órfão que precisa levar o de comer pra casa! - Berrava de sol a sol num bairro distante da sua casa, além dos óculos usava também um chapéu de palha para disfarçar o cabeção e as orelhas de abano.
— Vou te ajudar menino cego, mas tu poderias entrar na escola de violão! Uma vez eu vi com estes olhos que a terra há comer, foi lá no Juazeiro do Norte, um tocador, de nome Cego Aderaldo, cantando tão bonito que a gente tinha arrupeios! Agora tu ficas aí ripando a mão nas cordas sem saber cantar! Vou te ajudar agora, de outra vez passo e viro a cara pro mato! – Disse uma dona gorda e baixa dos cabelos pintados, quando jogou uma nota de cinco reais.
— Obrigado minha tia, mas num posso aprender nada não, tenho lombriga na cabeça!
— Eita, por isso eu vi que esse chapéu de marmota escondia alguma coisa! Deus seja louvado! – Saiu à mulher com seu corpo roliço, fazendo o sinal da cruz.
O lucro era de quase mil reais por mês, fora o que tirava para o almoço. Roberto Santos guardava tudo dentro de uma caixa e deixava em baixo da cama. A mãe continuava tendo filhos, que já não eram mais doados, mas sim, vendidos por ele em cartões de créditos, parcelados em até vinte e quatro vezes. Mas a policia foi informada, o negociante safou-se calado, enquanto a mãe e o pai bêbados e drogados, foram em cana. Já tinha dezesseis anos quando ofereceu o rim de um dos irmãos na internet, um comprador da Nova Guiné aproveitou-se da liquidação e levou as duas irmãs. Aos dezoito anos depositava quinze mil reais em conta no banco, quantia que havia juntado como falso cego e outras falcatruas. Tinha um relacionamento aberto com a namorada, o que permitiu que ela se engravidasse do patrão com o consentimento dele. O plano era entrar na justiça por assedio moral e estupro, dois anos depois ganharam a causa e mais um gordo deposito na conta de Roberto. Quando o filho já estava na creche, ele queria que a mulher desse outro golpe, desta vez no Ginecologista, mas o tiro saiu pela culatra.
— Ah não, desculpe, mas não vai rolar, vejo tanta maçã que aprendi gostar de banana! – Disse o medico mostrando a foto do namorado.
Roberto foi embora de casa. O norte que lhe guiava era a busca pela fortuna, “Roberto dos Santos será mais rico que Silvio Santos” Seu único pensamento, seu grande meta. No banco acumulava mais de cinqüenta mil, frutos das negociatas. Viu no jornal que garotas virgens estavam se leiloando na internet, eis uma oportunidade de ganho. Investiu num pomposo castelo e abriu o primeiro Puteiro de Virgens do Brasil. Com preços que variavam de dez a cem mil reais. Era o point dos magnatas, a dose de cachaça “Incha pé” que se pagava cinqüenta centavos no Boteco de Zaqueu, com o nome de “Hotpum” a dose era vendida a cento e cinqüenta reais. O pé de Frango era bem cozido e retirado os ossos, para se transformar numa espécie de sopa revigorante, com nome de “Lapacréu” cada prato não saia por menos de duzentos reais. O telefone tocava a todo instante;
— Alô reserve para eu por favor, uma virgem vesga e albina, uma garrafa de Hotpum e uma porção de Lapacréu com pimenta malagueta! – As fantasias não tinham limites.
— Alô eu quero uma virgem anã que queira transar na casinha do meu cachorro, sou anão também!
— Oi sou a Madre Joanita, mas meu codinome é Tia Loba! Mandem-me uma virgem loirinha vestida de Diabinha! Me passe o numero do disque maconha!
— Alô! Será que você me arranjaria uma filha de deputado? – Indagou um cliente de Claro dos Poções no interior de Minas Gerais, ganhador da Mega Sena.
— Olha, eu vou tentar, mas não te prometo! Por esses caras foderem tanto com a gente, estão sempre monitorando os seus, mas com uma propinazinha tudo se resolve! Aguarde que retornaremos. – Falou uma voz metalizada.
Minutos depois...
— Senhor, confirmado! Vai ser um pouquinho mais caro, porque esta é filha de um Senador, mas não se preocupe se não tiver todo o dinheiro agora, parcelamos no cartão e recebemos imóveis e veículos como pagamento!
Roberto Santos era o novo milionário da revista Forbes, em suas entrevistas aparecia fumando charutos cubanos e ostentando carros de luxo. O puteiro já era passado quando ele resolveu abrir uma Igreja para fazer concorrência a Universal.
— Já sou mais rico que Silvio Santos, agora vou na pisa de Edir Macedo! Quero uma Igreja e um Canal de Televisão, vou ser mais astuto que aquela raposa desvairada! Ele entrou nos Países Africanos? Pois eu vou abrir minhas igrejas no Afeganistão, no Azerbaijão e até no Botão, logo vou invadir Irã, Iraque e a faixa de Gaza, Palestinos e Israelenses se converterão por amor ou pela dor! – Bramiu com o microfone na boca, numa festa de lambe-botas.
Aquela área que um dia fora à casa de Batistelo Benedito Santana da Silva, com suas dezenas de irmãos e, os pais que morreram numa rebelião quando estavam presos. O doutor Roberto dos Santos comprou e com o apoio da justiça mandou desapropriar, chutaram como sacos de lixo a bunda de centenas de pessoas. Num daqueles dias o novo senhor da Revista Forbes, concorrente direto de Edir Macedo para levar almas para o céu, estava com um grupo de engenheiros, arquitetos, Empreiteiros e seguranças, fazendo as marcações técnicas no local. Quando um senhor magro de rosto murcho, olhos arredondados e profundos, sapato preto encerado, calça e camisa social, surrados, mas limpo, obtivera autorização para falar com o ele.
— Então? O senhor seja breve! – Falou secamente de olho num mapa.
— Vim apenas lhe dizer que pelo Terno que o senhor me roubou, pela Bicicleta que me tirou e pela minha casa que derrubou! Toma desgraçado! – A peixeira de açougueiro brilhou feito míssil na direção dele, mas a mão ágil de um segurança desviou a rota da lamina, imobilizando o agressor.
Vários policiais chegaram para deter o homem, que mesmo algemado em mãos e pés, urrava dizendo que a vitima era ele.
— Ele me roubou um terno, uma bicicleta, mandou derrubar minha casa e agora tira a minha liberdade! Eu quero justiça! Deus seu desgraçado me tira daqui!
Uma repórter ironizando aqueles apelos abriu os planos da câmera para mostrar o ilustre doutor Roberto dos Santos que vai usar o espaço onde viviam negros, drogados e outras criaturas em conflito com a sociedade. Para construir a casa de Deus e purificar as almas.