Pequenas histórias 150
Transpira o meio
Transpira o meio dia na pausa do almoço. Corre-se no tempo que não espera retardatários esquecidos do papel que representam. Transpiram-se as preocupações, onde os passos nas calçadas íngremes revelam-se numa sociedade burocrática que, implantada conscientemente em cada indivíduo, torná-lo-á em zumbi controlado.
Deslizo nas palavras contornando as asperezas afiadas mais que navalha de barbeiro. Revelo nas reentrâncias a agudeza de senti-las na totalidade de ser somente o que são: palavras.
Dentro da vida os gestos se materializam na proporção dos sentimentos emitidos ou revelados no grupo a que se pertence. Marginalizado grita a voz ausente do amor escondido nos cantos da cidade. Vou ao encontro do nada a procura de você e vejo o corpo da indiferença na sarjeta mendigando caricias a peso de ouro.
Esfolo a carne nas pedras da alma endurecida pela ganância de se querer cada vez mais. Ridículo o que eu disse? Até pode ser, mas o caso é que se precisa de muita coisa e nada se recebe.
Precisa-se de alimento para fomentar o medo de viver. Precisa-se da vida para que tenhamos nossa companheira à morte nos seguindo a espera do seu momento. Precisa-se do amor fundindo carnes para saciar a alma de culpa e pecado. Precisa-se da criança para que o futuro não seja interrompido na brutalidade da vida. Precisa-se do indivíduo contra o indivíduo reclamando seu lugar na sociedade de luxo e podridão. Precisa-se do homem com sua arrogância de macho para perpetuar a espécie. Precisa-se da mulher para agasalhar a semente que a fará complementar-se com a terra.
Na incompetência do sentimento está a destruição da humanidade.