A estudante na hora do almoço
Outro dia, enquanto almoçava no trabalho, observava, pela janela diretamente à minha frente, uma garota.
Fardada, provavelmente saindo do colégio, aparentava aguardar, lá do outro lado da avenida, um transporte para casa.
Estranhei o fato de estar sozinha. Geralmente nessa época de escola sempre andamos em bandos.
"Será que ela sofre bullying?". Pensei, já dentro da Lei de Murphy.
Não, provavelmente estava exagerando. Ela já deve ter se despedido de seus colegas e agora simplesmente aguarda seu ônibus.
Continuei então a observação, na falta de coisa melhor a fazer entre uma garfada e outra.
Vi-a tirando algo da bolsa. "Um livro, talvez? Duvido. Deve ser um celular".
Enganei-me duplamente - tratava-se de uma agenda, provavelmente com suas atividades escolares pendentes.
Depois de fechá-la, voltou à bolsa, desta vez retornando com um pente. Procurou, então, o espelho de um carro que estava numa vitrine próxima.
E lá se demorou, por longos minutos, tratando de suas madeixas. Um traço básico de vaidade que sempre achei especialmente enfadonho.
Já bocejando de tédio, dirigi meu olhar de volta à marmita, buscando aquela última garfada redentora que limpa o que restou da comida. Ao por o garfo na boca, olhei novamente pela janela, procurando a tal estudante.
Espantei-me. Naquele intervalo de três segundos a moça sumiu. Já não havia bolsa, pente, cabelo ou garota alguma do outro lado da avenida.
A única garantia de que tudo não foi uma fantasia é a minha memória, e, agora, este texto.
No mais, apego-me à crença de que ainda conservo plenamente meu juízo.