Quarto

Estava tudo um pouco diferente, eu sentia aquele ar estranho. Mais estranho ainda é saber que tudo estava exatamente no mesmo lugar com toda sua cor e formato, não me era possível entender o motivo de notar tamanha indiferença com aquilo que fazia parte de mim, do que as pessoas chamam de essência; do que eu chamo de guarda intimidade.

Sentei lentamente naquela que servia de descanso ao meu corpo, ela enfeitada com outros travesseiros num modelo diferente de lençol, talvez o único móvel que mesmo igual, carregava outras sutilezas. E assim fui percebendo que não são as coisas que mudam, mas nós que redefinimos a nossa forma de olhar, na medida que o lado adulto e cinzento de nossas escolham tomam o pedestal e o foco do sorriso que nem mais me fazia falta. Rir do quê? De minha pessoa? Talvez, um pouco. Ninguém ama o que não conhece, ninguém ri do que não sabe a verdadeira dádiva do motivo de rir. O sorriso sem motivo, seja mesmo com todos os seus defeitos, a única forma de autonomia, pois ali não residirá o arrependimento quando o sentido falecer, mediante causas tão pequenas que parecem monstruosas, alimentamos essas causas.

Aquele velho quarto em que eu mais nunca tinha passado um dia inteiro trancafiado com a música de fundo entoando a boa recarga de minha alma. Fique num quarto e conheça não somente sua intimidade, mas o seu projeto de ambição. Daqui vem os sacrifícios mais severos da própria existência, viver para quem? Quem para morrer? Morrer e, agora, viver onde? A música estava tímida, e mesmo os móveis na sua devida formação, eu precisava de um pouco de caos, talvez para fugir de mim, ou talvez para entender que vivo numa sociedade tão pequena que o meu eu é capaz de responder por todo um variado de causos. Me deixo levar pelos mesmos momentos, querendo entender o que já entendi e ainda na questão envolvo outros problemas. Chamam-me de apreensivo. É verdade, confesso, mas é me deixando partir nos mesmos instantes, que tento voltar ao oceano e hidratar-me com todas as conclusões que aparecerão. Quais? Não sei, elas somente aparecerão, vestida de noiva ou nua encontrada morta numa floresta qualquer vítima de estupro.

Lucas Nelson
Enviado por Lucas Nelson em 28/09/2018
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