ECOS DE DOMINGO
Da  série: Diário de minhas  andanças


(02/11/2010)
Cai a tarde de domingo como caem as tardes de todos os domingos:
Insossas,plenas de retornos,ressacadas,enfim...
Depois de mais um dia de brilho ,o sol aquieta-se num esconderijo qualquer além dos montes e sobras daquilo que fora borram o céu de um azul acanhado.
Vem de muito longe a cantilena dos sabiás da tarde e aquela melancolia gorjeada pelo arvoredo, morde impiedosamente os pássaros indefesos pelas gaiolas do peito.
Na estrada deserta segue um caminhante.
Rumina pensamentos,afloram-lhe lembranças,questiona-se...
[ Intimamente, ri de si mesmo ]
Na casa de esquina , uma senhora idosa se expõe por inteiro enquanto sabiás cantam.
O rosto entre as mãos, aparentemente ansiosa, olhar pensativo acompanhando a leveza do vai e vem de uma cortina na janela entreaberta.
[ A casa é antiga e  a tarde  é morna ]
Alguns arbustos com pontas ressequidas,disfarçam as “vergonhas encardidas “ do muro sem reboco e no pé de camélias, entranhado , ele:
O sabiá !...
Trinados repetitivos dando o tom às aparentes solidões da anciã e caminhante.
[ Cúmplices olhares rastelando a vastidão fumarenta da tarde que agoniza ]
Vagueia uma sensação de que , findas todas as possibilidades, dois corpos cansados e abatidos estão prestes a jogar as toalhas, rendendo-se à seus algozes.
...E a tarde de domingo deita-se feito teia de uma aranha faminta tecendo amarras em corações fragilizados.
Num gesto formal de cumprimento ,as expressões indisfarçáveis de quem tenta vasculhar o íntimo, um do outro, cruzam-se em silêncio.
Envolta em xale cor de abóbora , a idosa retoma o caminho da casa.
O "toc-toc" da bengala fere a calçada de tijolos ladeada de gerânios.
[ Incansáveis, prosseguem os sabiás pelas cercanias ]
Cadenciados,os passos ,tamborilam as pedras que desenham uma cedilha no entorno da moradia de esquina.
Um trem apita à distância...
De resto...Quietude, nostalgia, devaneios...
Embalados aos "ecos de domingo".

Joel Gomes Teixeira