O "moço do parque"
Tinha de avançar na sua tese mas o pensamento estava em outro lugar. O sorriso maduro e os cabelos grisalhos daquele homem não lhe saíam do pensamento. Fechou o notebook, afastou a cadeira e se deixou ali nas lembranças dos encontros no parque, que ela suspeitava, eram "por querer" que Armando sempre se deixava na sua área de visão. Ele não parecia muito interessado mas no início dava um jeito de que seus olhares se cruzassem. De um tempo pra cá eram tão constantes que ele passou acenar de longe, depois foi chegando mais perto até o ponto de ler suas maltraçadas linhas, que ela mostrou após a insistência dele.
No último sábado fizeram uma caminhada juntos e ela pôde conhecer um pouco da vida daquele sujeito "do parque". Era assim como Aninha, sua melhor amiga vinda do Rio Grande do Sul para morarem juntas, se referia a ele quando pegava a "guria" absorta com uma "carinha de feliz, tchê!!!".
Ela falou do mestrado, do intercâmbio em Londres, do grupo de teatro que precisou abandonar e ele contou do casamento, dos filhos e do ex-sócio que lhe deixou uma dívida para pagar.
O telefone tocou e os pensamentos de Marcela se desfizeram no ar como bolha de sabão. Era Gustavo, desmarcando a sessão de cinema que haviam combinado no dia anterior. Ele tinha de cobrir um plantão novamente.
- O que há com você, não vai reclamar?
Marcela sorriu e disse que estava tudo bem. Retomou sua tese pois tinha data para entregar.
Nota: continuação da crônica Seu Vigia.