Passado e Presente
Foi em uma ida ao médico, levar o nosso genitor que eu e meu irmão mais velho ficamos sabendo de coisas interessantes que estavam no tesouro do coração de meu pai.
Saímos cedo pra pegarmos a estrada desafogada. E o tempo todo saía um história da memória de meu pai que nos encantava.
O caçula atento ao volante dava aquele sorriso maroto torcendo os lábios carnudos.
Era um filme que na cabeça do patriarca, saía tudo humoristicamente. Ele relembrava as idas ao glorioso Piauí em décadas passadas sempre em busca de saúde. Dele não, sempre da Rosa, isso mesmo, Rosa de registro e em pessoa. Foi a moça que encantou o coração dele e que hoje é nossa rainha do lar.
Falava de histórias tristes em tempos difíceis e como fazia para levá-la ao médico na capital vizinha. A parada em Timon, era na casa da comadre Preta, madrinha do caçula. E ali ficavam dias indo, e vindo ao médico na capital ligada pela ponte metálica que une os estados vizinhos: Maranhão e Piauí.
Era sofrimento, ela era muito doentia e eu tinha medo de ficar com a gurizada toda sozinho e pensava cá dentro quem era que ia me querer com tanto menino pra criar se esta mulher morrer- dizia ele brincando no banco de trás. Só pra ele naquele dia e mais ninguém. Era prioridade dele mesmo, já estava com setenta anos, tem todo direito.
Tudo parecia nostalgia, era realidade, saía tudo coerentemente, sem as palavras tropeçarem.
Vinha na lembrança dele que quantas vezes ia a Timon com sacos nas costas, ora de coisas da roça, ora do pomar de casa para vender e fazer uns trocados para ajudar nas despesas de casa que um amontoado de doentes e acompanhantes se acomodavam.
Ele lembrava de tudo e contava com ar de alegria, porque hoje está tudo diferente. Filhos criados, esposa ao lado e a família toda e eles aposentados com toda graça que Deus tem dado. Tudo que dizia comparava com o hoje chamado presente, que faz a gente sentir e entender e valorizar o porquê das coisas.
Chegamos na clínica ainda estava fechada. Toinho pegou a senha, ele e eu sentamos, pai foi ao banheiro, logo voltou e ficamos ali com outros pacientes à espera do médico.
Foi atendido, o médico deu lhe uns esfregas de palavras duras, pois fazia 1 ano e meio que Francisco da Silva, lá nem pisava, ele se explicou e foi bem orientado a cuidar do sacrário humano que pulsa sangue até longínquos capilares. Ganhou remédios. Tomou os ainda na clínica, a pressão estava dezessete por dez, fez exames e perto do meio-dia saímos pra repetir o percurso, porém as histórias seriam outras, de fato foram. Lembrava que não havia transporte coletivo, as pessoas pagavam jipes, carros da época para transportá-los.
Foi lembrada uma viagem no ano de 1976, quando Rosa foi levada a tratamento pós-parto e que o menino havia ficado sob cuidado da dindinha Bita do Louro Camilo. E que em uma certa madrugada, saiu embrulhado em trapos nos braços de seu pai ao encontro de sua mãe, pois o nascido nem tinha sentido o cheiro do leite materno, e nem recebido o colostro para fortalecer-se e enfrentar a vida.
Papeiro, colher, lata de massa e pacote de leite iam em sacos de panos, junto aos panos de vestimentas. O mingau ia embrulhado para não esfriar e no balanço do carro quando o pivete chorava seu pai tacava lhe a mamadeira de mingau.
Papai relembrava porque naquele dia ele levava embrulhado o menino e agora ele que estava sendo levado ao médico pelos filhos mais velho e mais novo, no transporte do filho, que hoje está vivo apesar dos muitos desafios superados.