POLÍTICA & ESPERANÇA

Começo meu texto sob uma estridente sonoplastia na minha janela: Então, lembro que chegou a primavera e , mais que preciso sonhar, é urgente semear flores.

Rodo um “playback” dentro de mim e faço uma analogia às primaveras que todos sonhamos na nossa vida social de brasileiros cidadãos republicanos:a de reflorescer e caminhar juntos por rotas felizes, a de voltar a ser um país uno e pacificado.

E esse tema das flores não é novo, já nos foi cantando por Vandré.

Brevemente as eleições baterão às nossas portas e, muito assustada com o todo dos acontecimentos, confesso que pela primeira vez na história da minha vida de eleitor, de mera e anônima “gente do povo”, me deparo com uma ansiedade enorme, aquela vontade de acertar nas minhas escolhas que , por tudo que é sagrado, ainda não se definiu.

Como está difícil...escolher com consciência, representatividade e esperança.

É como procurar agulha num palheiro ou juntar a areia do mar.

Não é preciso se ser nenhum gênio da sociologia e da política para perceber que nossa divisão político-social hoje é patológica e quiçá tenha caminhado como numa carta de intenção à nossa navegação pelo tempo.

Estamos (quiçá continuaremos?) totalmente a deriva...

Há muitos anos seguimos, dentro duma status político que se diz democrático, republicano e igualitário, divididos entre o “bem e o mal”, como naqueles desenhos infantis da minha geração, em que eu batia palmas quando sentia que o bem venceria no último segundo.

Criança nunca sabe de nada e essa é a grande dádiva mágica do desconhecimento dessa fase da vida.

Depois disso, desconhecer é tragédia social anunciada.

Hoje adulta- e faz tempo!- estou até agora à espera do meu super herói que dirija minha mão nas urnas e nos salve rumo a um bom futuro à vida do meu país.

Mesmo ainda sabendo pouco e entendendo nada, eu me pergunto: Mas que guerra insana entre “o bem e o mal” seria essa pelos nossos dias de hoje em dia?

Sinto que seguimos socialmente tribais.

Teríamos solução por meio de alguma mão humana?

Tal seria crível?

Aos berros pela igualdade, pela justiça social, pela decência e ética na política, seguimos selvagens, pelo nosso instinto ( social?) animalesco e aflorado, todavia, cada vez mais pifiamente segmentados por diferenças biológicas, sociais e culturais crescentes.

Segmentamos o direito ao Direito. Olhem isso!

Curiosa essa igualdade tão diferenciada que construimos...

Depois jogamos pedras, chamamos de privilegiados os agraciados pelo acesso ao mesmo Direito pelo qual lutamos a todos.

Coisa maluca essa. Dolorida, sectária, injusta, bestial.

Que igualdade queremos, afinal?

Essa de nos exterminarmos como "mais inteligentes", todavia cada vez mais infelizes e irracionais?

Essa dinâmica de nos atacarmos em todos os cantos da nossa triste trajetória de seres ditos “polis por natureza”, cidadãos perdidos do senso de si mesmo mas com razão acima de tudo e de todos?

Será essa nossa patética luta pela justiça social?

Nosso todo é tão selvagem que sinto que uma” rinha de galos” seria mais nobre que nosso cenário atual de humanos.

Conto que dia desses, “in box” e do nada, uma pessoa que bem depois se desligou da minha página social, me perguntou assim:”fala a verdade, você é de esquerda, não é? Você não me engana, eu sinto nos detalhes do que você escreve, diz aí logo, eu gosto de sinceridade, não gosto de hipocrisia!”.

Achei curiosa aquela colocação, parei para pensar naquele porquê tão invasivo e desesperado e lhe respondi educadamente : “não se é de Esquerda só por se ser Humanista e não se é de Direita só por se acreditar no bem estar social proposto pelo positivismo da nossa Bandeira”.

“Ah, desculpe, que alivio, é que eu sou genuína, Graças a Deus você não é da Esquerda, obrigada! “-me respondeu a tal pessoa num alivio instigante ao pensamento.

Dia depois se desligou da minha página, por desconfiar do meu “esquerdismo mascarado”. Fato bem emblemático do todo...

“Seria eu alguém em cima do muro?” então me perguntei.

Quem seria eu afinal, um perigoso ser oculto do mal, só porque manifesto meu pensamento arrazoado para um país mais justo?

Afinal, quais adjetivos humanísticos precisamos levantar só para ganharmos um carimbo de Esquerda ou Direita?

Não dá só para se ser gente lúcida, Meu Deus?

Ou lucidez é doença?

Deduzi comigo que eu sou sim, uma média aritmética sem ponderação dos meus sentidos ponderados, embora utópica, tentando escolher melhor para ser minima e socialmente feliz no meu país.

Hoje, diante do todo daqui e do mundo, seria muito pequeno escolher apenas entre dois sentidos de rotas a seguir para uma resolução sócio-política tão complexa, tão emergente.

Então, isso posto e para terminar, quero falar da esperança.

Como se ter esperança com as lentes dos olhos aumentadas pela consciência?

Política e esperança são compatíveis nesse planeta?

Concluo que, só a olhar para o cenário do Brasil de hoje, sinceramente, ter consciência é como condenar a esperança a pena de morte.

Nas urnas da atualidade , teremos que escolher entre a triste apatia do ignorar o óbvio e o veredicto utópico de se votar consciente por mudanças que muito provavelmente não virão, para nos devolver prontamente a paz coletiva da cidadania furtada.

Quanto à Humanidade, essa da qual fazemos parte enquanto História de Nação, sinto que nos reciclamos de gerações em gerações (muitas perdidas!) na alternância das urnas insípidas, a escolher entre A APATIA INSCONSCIENTE e o ACREDITAR NÃO FUNDAMENTADO.

Trata-se dum destino triste, concordam?

Ser aprisionado entre dois obrigatórios caminhos de opção só para neles se continuar seguindo aos berros com a esperança morta.

Legitimamente triste é, frente a tão pequenos e cartesianos sentidos de escolhas, se perceber claramente sem NENHUMA direção.

A isso eu chamo de castigo existencial: colhe-se o que se planta.

Contudo, como novamente é primavera, é preciso “replantar as flores”, antes que elas desistam de voltar na sua pueril singeleza do simplesmente existir... ( Lembrei que Alberto Caeiro poetaria melhor, obviamente).

É urgente que adubemos a terra!

E ainda que incrédulos do meio, é preciso acreditar que nos é possível ressuscitar socialmente unos, em toda a contagiante diversidade das flores dum pacificado jardim, como assim o é todo milagre inexplicável da gratuita reflorescência da vida.

Saibam que, na poesia, diferentemente da política , o mais improvável milagre sempre está ao alcance dos versos mais simples.

Essa nossa triste realidade (em contra- ponto ao verso de Caeiro) precisa muito da união de todos nós.

Segue um Lírio- da- Paz a todos.

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Quando Vier a Primavera

Trecho de Alberto Caeiro

Quando vier a Primavera,

Se eu já estiver morto,

As flores florirão da mesma maneira

E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.

A realidade não precisa de mim.