O ELEITOR E O BURRICO

O primeiro livro que li foi 'Burrico Lúcio', do escritor sírio-greco-romano Luciano de Samósataque. O livro conta a história de Lúcio, um jovem que é transformado em um burrico e se vê, de uma hora pra outra, às voltas com ladrões, aproveitadores, servos e escravos, vivendo com eles uma série de aventuras.

Adolescente tive a oportunidade de ler 'Metamorfose', do escritor alemão Franz Kafka. Numa certa manhã, Gregor Samsa acorda metamorfoseado num inseto monstruoso. Kafka descreve este inseto como algo parecido com uma barata gigante.

Existem muitas semelhanças entre um 'homem burro' e um 'homem barata'. O jovem Lúcio, por exemplo, na condição de animal, tem uma vida agitada, aprende com suas experiências o que é bom e o que é ruim. Quando volta ao normal é um jovem amadurecido e consciente.

O caixeiro viajante Gregor Samsa, personagem de Kafka, quando se vê no corpo de uma barata não se preocupa pela transformação, mas sim pelo fato de estar atrasado para o trabalho. Samsa abandonara seus desejos para sustentar a família e pagar as dívidas de seus pais.

Gregor e Lúcio são personagens atuais com os quais convivemos internamente. Ambos tiveram a experiência de viver uma outra vida, de se colocar no lugar do outro. Seria institucionalmente benéfico se, na hora de votar, os eleitores fossem mais Gregor e Lúcio e menos burricos e baratas.

A literatura é capaz de transformar insetos em homens, príncipes em sapos, abóboras em carruagens. Fora a literatura somente a política é capaz de transformar o homem em outra coisa, objeto ou animal.

Ricardo Mezavila.

Ricardo Mezavila
Enviado por Ricardo Mezavila em 20/09/2018
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