À L. K. N. Almeida, vítima de feminicídio.

Esse texto é dedicado a alguém...

A alguém que até hoje eu não tinha dedicado nada.

Eu pensei no que colocar aqui.

Procurei imagens bonitas, coloridas, felizes, porém me toquei que não combinava muito com a situação, mas talvez combinasse com ela, no entanto sequer sei a sua cor preferida.

Pensei no que escrever aqui.

Olhando algumas fotos espalhadas em uma rede social na internet, eu encontrei o seu sorriso. Eu gostei de ver! O que me incomodou foram as frases e os títulos dos álbuns de fotos que geralmente continham a palavra saudade.

Não! Eu não estou sentindo saudade! Poderia sentir saudade de algo que não vivi? Não sei definir bem o que eu estou sentindo.

Dá um tempo, tá? Quando eu fiquei sabendo o que aconteceu capaz de interromper aquele sorriso, eu tentei respirar e oxigenar meu cérebro.

Eu tentei organizar as ideias. Eu juro que tentei! Tentei me acostumar que era apenas mais uma. Pura estatística. O problema é que eu não suporto números, eu gosto é de sorrisos.

Desde aquele dia de manhã, ao contrário do dela, meu coração continuou batendo, mas não do mesmo jeito! Minha cabeça passou um tempo projetando apenas uma imagem. Agora, a projeta em um intervalo de tempo maior.

Veio-me também à cabeça durante alguns dias a conjunção condicional "se" aplicada a muitas frases. E eu consegui visualizar todas as situações que esse "se" provocaria. Mudaria tudo. Hoje, os verbos  poderiam ser conjugados no presente e nas frases em que ela fosse o sujeito. Talvez ela e eu pudéssemos formar um sujeito composto, quem sabe uma história, uma amizade.

São tantos pensamentos e sentimentos. Antes que você me pergunte... Não! Eu não a conhecia. Nem de vista e nem de ouvir falar. Nada! Sabe aquelas coisas de destino? Pronto. Nenhum esbarro acidental ao meio da rua.

Mesmo sem ter qualquer tipo de relação, eu pensei no dia dos pais. Pensei que talvez ela tivesse comprado uma gravata azul que ficou guardada na gaveta, junto com um cartão que ficou em branco. Pensei muito no cartão em branco.

Não pude deixar de pensar também no dia das mães. No dia das mães do próximo ano. De terem tirado o direito de uma criança desejar feliz dia das mães.

Eu não consigo ser alheia ao seu sorriso e ao que o interrompeu. Eu penso nas pessoas, nos amigos, nos familiares. Eu penso na dor. Eu penso nela, nos seus gostos, no som da sua voz, nos seus sonhos. Eu fico imaginando...

O que me deixa triste não é o fato de não a ter conhecido, é de não poder conhecer agora. E igual a ela outras vão embora todos os dias. Todos os dias a ordem natural das coisas é interrompida. E a gente tenta engolir isso com groselha. Quer saber? Eu odeio groselha, eu gosto é de sorrisos!

Neste momento, além da imagem projetada na minha cabeça em espaços de tempo cada vez maiores, da conjunção condicional "se" aplicada a todas as frases inimagináveis, está vindo outra palavra. Faço questão de deixá-la aqui de todas as formas que ela possa ter:

Por que ….? … por quê? …porque… o porquê…

Não, não justifica! E mesmo que justificasse, eu não gosto de justificativas, eu gosto é de sorrisos!

*L.K.N.Almeida, que tinha uma filha, foi assassinada aos 22 anos de idade pelo ex-companheiro que não aceitava o fim do relacionamento.