Ele cata ou espalha o vento?
Entre tantos outros sem muita importância, aquele pequeno objeto estava ali esquecido em um canto da casa, resultado da desordem deixada pelas brincadeiras da noite anterior. De repente, sem ligar para outros brinquedos bem mais interessantes, o pequeno debruçava-se sobre ele e, em silêncio, contemplava-o. Em sua fantasia, certamente o objeto fazia parte de seu mundo. Se não, por que o interesse?
Sonhador, mas sóbrio em si mesmo, ele foi prosaico e começou a conversar, demonstrando particular atenção àquele brinquedo que o arrancava da sua interioridade, como fazem as histórias de fadas com suas encantadoras imagens. Foi dali que ele resolveu sair e, com o brinquedo nas mãos, veio ao meu encontro, perguntando:
– Vovó, me explica esse brinquedo e diz por que ele se chama cata-vento. Ao invés de explicar o significado e mais para medir sua curiosidade, perguntei-lhe: o que você acha? Prontamente ele respondeu: – eu acho vovó, que ele é um espalha vento, porque quando a gente sopra ele roda a flor e faz ventar... e, se eu colocar aqui no pozinho ele espalha, olha!
Segurei a minha onda para não sorrir de sua mais brilhante e pura curiosidade! Ao observá-lo, fiquei pensando o quanto as crianças, brincando, voam e se libertam. Para Walter Benjamin, “rodeadas de um mundo de gigantes, as crianças criam para si, brincando, um pequeno e próprio mundo”. Na minha concepção, estes são mecanismos que elas criam para chegar ao conhecimento das coisas em torno de si, pois nesses momentos elas são capazes de elaborar os mais inusitados e surpreendentes conceitos.
Conversamos um pouco e eu pedi que ele fosse brincar, pois eu tentava fazer a leitura de um dos livros que subsidiavam os fundamentos teóricos da tese que eu ansiava terminar, haja vista o prazo se esgotava e o dia previsto para a qualificação se aproximava. Mas, como pedir que uma criança movida a brincadeiras e curiosidades entendesse dessas coisas? Larguei tudo e fui beber daquela fonte, bem mais interessante naquele momento.
Ao perceber que ele, não só procurava companhia para brincar, mas apesar da pouca idade levantava hipóteses sobre as coisas, larguei as leituras e, sem nada comentar pensei: ele parece um pequeno filósofo! Nós dois sentamo-nos ali, no chão, e começamos a brincar. Eu me fiz criança, como todas as crianças querem que nós, os adultos, sejamos com elas. Para minha surpresa ele perguntou:
– Vovó, tu parou de ler o teu livro importante e veio brincar comigo?
Sim. Respondi. Ele mais que depressa me exortou a pegar um depósito de letrinhas numa prateleira que estava a nossa frente, o que fiz sem retrucar. Sentados ali, eu e ele, começamos a brincar. Ao lado, estava o pequeno objeto, aparentemente abandonado, decerto perdera o encanto –, pensei! Perguntei o que ele queria fazer com as letras e ele, mais que depressa, derramou todas elas que se espalharam pela sala. Ele pensou um pouco, olhou-me e disse:
– Vamos brincar de criar palavras?
Respondi afirmativamente. Vamos! Nunca imaginei que a questão, há pouco levantada sobre o brinquedo, ainda o inquietava e fosse retomada. Ele, na sua iniciada alfabetização, começou a dispor as letras, tentando formar um nome, ao que eu observava em silêncio. Demoradamente, ele dispôs as letrinhas e falou: olha vovó, eu fiz esse nome E P A L H AV E T O.
Comovida eu o abracei feliz, porque pude partilhar daquele momento tão sublime na vida dele, meu neto de cinco anos, o Filipe!
Camila Nascimento.
São Luís/Julho/ 2015.
Entre tantos outros sem muita importância, aquele pequeno objeto estava ali esquecido em um canto da casa, resultado da desordem deixada pelas brincadeiras da noite anterior. De repente, sem ligar para outros brinquedos bem mais interessantes, o pequeno debruçava-se sobre ele e, em silêncio, contemplava-o. Em sua fantasia, certamente o objeto fazia parte de seu mundo. Se não, por que o interesse?
Sonhador, mas sóbrio em si mesmo, ele foi prosaico e começou a conversar, demonstrando particular atenção àquele brinquedo que o arrancava da sua interioridade, como fazem as histórias de fadas com suas encantadoras imagens. Foi dali que ele resolveu sair e, com o brinquedo nas mãos, veio ao meu encontro, perguntando:
– Vovó, me explica esse brinquedo e diz por que ele se chama cata-vento. Ao invés de explicar o significado e mais para medir sua curiosidade, perguntei-lhe: o que você acha? Prontamente ele respondeu: – eu acho vovó, que ele é um espalha vento, porque quando a gente sopra ele roda a flor e faz ventar... e, se eu colocar aqui no pozinho ele espalha, olha!
Segurei a minha onda para não sorrir de sua mais brilhante e pura curiosidade! Ao observá-lo, fiquei pensando o quanto as crianças, brincando, voam e se libertam. Para Walter Benjamin, “rodeadas de um mundo de gigantes, as crianças criam para si, brincando, um pequeno e próprio mundo”. Na minha concepção, estes são mecanismos que elas criam para chegar ao conhecimento das coisas em torno de si, pois nesses momentos elas são capazes de elaborar os mais inusitados e surpreendentes conceitos.
Conversamos um pouco e eu pedi que ele fosse brincar, pois eu tentava fazer a leitura de um dos livros que subsidiavam os fundamentos teóricos da tese que eu ansiava terminar, haja vista o prazo se esgotava e o dia previsto para a qualificação se aproximava. Mas, como pedir que uma criança movida a brincadeiras e curiosidades entendesse dessas coisas? Larguei tudo e fui beber daquela fonte, bem mais interessante naquele momento.
Ao perceber que ele, não só procurava companhia para brincar, mas apesar da pouca idade levantava hipóteses sobre as coisas, larguei as leituras e, sem nada comentar pensei: ele parece um pequeno filósofo! Nós dois sentamo-nos ali, no chão, e começamos a brincar. Eu me fiz criança, como todas as crianças querem que nós, os adultos, sejamos com elas. Para minha surpresa ele perguntou:
– Vovó, tu parou de ler o teu livro importante e veio brincar comigo?
Sim. Respondi. Ele mais que depressa me exortou a pegar um depósito de letrinhas numa prateleira que estava a nossa frente, o que fiz sem retrucar. Sentados ali, eu e ele, começamos a brincar. Ao lado, estava o pequeno objeto, aparentemente abandonado, decerto perdera o encanto –, pensei! Perguntei o que ele queria fazer com as letras e ele, mais que depressa, derramou todas elas que se espalharam pela sala. Ele pensou um pouco, olhou-me e disse:
– Vamos brincar de criar palavras?
Respondi afirmativamente. Vamos! Nunca imaginei que a questão, há pouco levantada sobre o brinquedo, ainda o inquietava e fosse retomada. Ele, na sua iniciada alfabetização, começou a dispor as letras, tentando formar um nome, ao que eu observava em silêncio. Demoradamente, ele dispôs as letrinhas e falou: olha vovó, eu fiz esse nome E P A L H AV E T O.
Comovida eu o abracei feliz, porque pude partilhar daquele momento tão sublime na vida dele, meu neto de cinco anos, o Filipe!
Camila Nascimento.
São Luís/Julho/ 2015.