Levaram minhas camisas.
Levaram as minhas camisas "boas", todas! Eram cinco ou seis, mas ainda assim, eram tudo que eu tinha que me deixava apresentável. Eu morava em um apartamento de uma vila horizontal e o vizinho do lado logo veio dizendo: "Isso é trabalho de malandro aqui do bairro mesmo. Eu posso até adiantar quem foi... conheço 'todo mundo' aqui". E continuou: "Aqui eu mando no pedaço. Deixa comigo que resolvo essa parada pa tu". Na verdade se referia ao bairro ao lado que mais parecia uma favela de tantos becos, morros e ladeiras. "Me adianta dez! É o preço deles! Eles roubam e depois dizem que sabem que foi. Aí alegam que têm que pagar pra trazer de volta...". Relutei, mas meu vizinho falava com tanta convicção que resolvi desembolsar dez reais. Ele logo pegou sua bicicleta e foi "resolver a parada". Esperei por muito tempo e quando já estava até esquecendo eis que reaparece meu vizinho, a pé e com cara de tristeza.
- Vocês não vão nem acreditar! Encontrei um chegado meu lá no local e de cara ele já disse que sabia onde estavam as camisas. Pediu os "deizão" e a bicicleta pra ir buscar. Esperei por quase duas horas e nada. Dancei na bicicleta, também.
Perdi as camisas e mais dez reais e meu vizinho a bicicleta e o "prestígio". Soube que depois o coitado localizou sua "magrela" e comprou-a de volta por trinta reais, mas depois de ser passado prá trás mais uma vez num beco próximo. Contou ainda que um outro malandro mostrou uma foto da bicicleta e pediu-lhe 'cinquentão'. Só tinha cinco: foi o que perdeu dessa vez... e ainda cantando de galo...: "É meu irmão! A gente tem que ser malandro também!"
Depois disso levaram mais roupas minhas, mas ai o prejuízo foi bem menor... Saí do Bairro, mas sem ressentimentos. Apesar de tudo era muito tranquilo... sem falar que já faz muito tempo.