EVOLUÍMOS PARA NUNCA SAIR DAQUI
A descoberta de planetas orbitando outras estrelas distantes do nosso Sistema Solar tem empolgado a comunidade científica. Se diz de alguns deles, serem semelhantes à Terra e podem ser habitáveis. A ficção enxerga hipotéticos novos lares para nossa raça.
O primeiro passo que a ficção precisa dar rumo à realidade, é construir naves que nos levem até lá no menor tempo possível. Esse menor tempo possível, ainda significaria viajar por centenas de séculos até chegar ao destino final. As velocidades das viagens juntamente com a hibernação mostradas na ficção jamais serão realidade.
Mesmo que a tecnologia nunca alcance o status de infalível, acredito que essas naves deixarão de ser ficção. Quando isto acontecer, esbarraremos num problema maior. A fragilidade da raça humana. Que tem nas suas virtudes e defeitos o ponto de partida dos conflitos existenciais, morais, éticos e psicológicos. Evoluímos para nunca sair daqui.
Muitos desses conflitos são percebidos no filme “Passageiros” de 2016. Após 30 viajando, uma pane na nave acorda o passageiro 1498 de sua hibernação 90 anos antes de chegar ao destino. Jim aguenta um ano vivendo sozinho. Muitas vezes, ele afoga as mágoas no bar da gigantesca nave. Lá o barman e confidente é o robô Arthur.
Já próximo de convocar a presença da morte, passeando entre os passageiros em hibernação Jim vê a escritora Aurora Lane lindamente dormindo. Começa ali um conflito moral e ético. É o instinto sexual humano quem vence. Aurora é acordada. Sim sexual. Se o desejo fosse por companhia, Jim poderia acordar qualquer outro homem.
A imprevisibilidade do instinto humano aparece. A paixão inicial é engolida pela raiva quando Arthur fofoca para Aurora que seu acordar não foi um acidente. E mais uma vez, a estranheza da mente humana se escancara. Para Aurora não desistir de salvar a nave, Jim lembra dos outros 5.000 adormecidos. Eles podem morrer. Seu instinto sexual nunca se lembrou que Aurora morreria antes de chegar ao destino sem a hibernação.
Existe uma espécie de reality show selecionando pessoas para uma viagem só de ida ao planeta Marte em 2023. Duzentas mil pessoas já se candidataram. A euforia é compreensível. E nem é como ir até o nosso quintal. No máximo na porta da cozinha. Talvez, oito meses de viagem. Com um detalhe. Sem hibernação.
A ficha começará a cair quando o planeta Terra for ficando pequeno pelas escotilhas da nave. Mesmo que sejam selecionados por uma inteligência artificial, conflitos humanos dos simples aos complexos explodirão entre os viajantes. As diferenças, crenças, ideologias, fofocas, inveja, ódio, desejos e ciúmes não ficarão aqui na Terra.
Descobriremos então que somos mais feios e predadores do que aqueles alienígenas babando nas ficções. Com outro detalhe. Diferente da ficção nós somos reais.