Reflexões sobre a minha terra

Reflexões sobre a minha terra






Algo inexplicável, embora palpável como uma jaca, situa-se no lance dos estados, digo, os estados brasileiros. Por que as pessoas que nascem na Bahia são daquele jeito? A mesma pergunta vale para Minas, Goiás, etc. O que é que há? Um código de barras invisível junto com um arquivo cívico secreto que faz com que gaúchos sejam do jeito que são e paranaenses do jeito que são, porque, pode reparar, são jeitos distintos.

Sinto-me entre o mesmo povo se estou no Vale do Anhangabaú ou no bairro da Aclimação. Sinto que estou na mesma unidade da federação. A unidade São Paulo. Mas, quando me desloco para a unidade Minas, pronto, saí de um compartimento e entrei noutro.

No mapa federativo brasileiro, cada estado tem um desenho. Uma das melhores coisas de ter cursado o primário nos anos 60 foi fazer - e colorir - mapas.

Por que cargas d‘água eu saio de Governador Valadares e o povo fala de um jeito e ao entrar na Bahia pela porta próxima a Teófilo Otoni percebo que os postos de gasolina são iguais e os frentistas diferentes?

As linhas invisíveis que separam os estados demarcam alguma coisa a mais além das explicações sociológicas, e não vai me dizer que é só porque num lugar tem cocos e no outro pinhão, e ou também, com o sol inclinadinho na latitude 16xis as pessoas falam oxente e no quadrante 14xis/2 falam uai. Noutra região exclamam tchê.

O ar... O ar muda de um local para outro. O ar de Itanhaém me parece mais fresco que o do Guarujá. O ar que se respira em Tiradentes não é o mesmo em Congonhas do Campo.

O que é que nos une?

Em Belém come-se tacacá. O floripano ao falar faz saltos entre agudos e graves de modo bastante peculiar. Um músico espirituoso diz que a escala mixolídio é puro nordestino, some-se a isso um tênue pizzicato e temos o sotaque alagoano, diferente em nuances do cearense.

Politicamente, pelo andar da carruagem, estamos longe de ser a planície em vez da montanha. Uma perspectiva, dentre centenas, dos nossos momentos vindouros desenha versão próxima dos Anasazi, o povo indígena que habitou a América do Norte 13 séculos antes de Cristo e simplesmente desapareceu.

O paulista puxa o erre, 50 anos atrás esse fenômeno era flagrante no interior do estado. Na capital, de modo geral, falava-se de um jeito que hoje não se usa mais. O erre carregado predomina.

O arranjo das coisas na máquina estatal brasileira inclina-se na definição "plutonomia", vide ausência de ética econômica e social.

Num ano eleitoral singular como este, onde debates pífios soam mais como um monte de escombros face a modernidade do mundo que clama mudanças objetivas e produtivas, distantes anos luz das retóricas embaçadas de uma gente suja até os ossos, os candidatos às tetas são em si, notícias falsas, na sua esmagadora maioria. Tem um ou outro que talvez se salve, particularmente não coloco a mão no fogo por ninguém, o tempo vai dizer e cá entre nós, depois dos trogloditas das últimas décadas, muita gente suspira por uma variante do porvir que venha a ser benfazeja.

Quem se habilita a fazer grandes apostas?
O país dará um grande salto no dia em que o coletivo gritar: Xô repórteres do drama e da mentira!

Resta o terreno da fé para seguir adiante utilizando bússolas com certa substância de rarefeita tangibilidade. Seria preciso que em cada ângulo de nossa pátria pairasse no horizonte um novo mote - nada do que aconteceu no passado precisa acontecer no futuro. Aliás, está mais do que na hora de transformar o passado em sabedoria, único caminho para que cada individualidade desta terra conclua ser a mesma uma caprichada e íntegra composição de todos nós.

(Foto:  autoria desconhecida)
Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 25/08/2018
Reeditado em 14/05/2020
Código do texto: T6429957
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