Crônica de um estrangeiro no manicômio
Acordei pela manhã e os meus olhos estavam cansados, mórbidos, sem brilho, profundos como um esgoto no meio da cidade. Ainda tinha o resto do dia para suportar, e minhas costas doíam, e eu estava sozinho comigo mesmo. Isso sempre será um problema.
Então resolvi enfrentar meus problema...!Voltei a dormir.
Acordei já era tarde, umas 14 horas pelo menos. Tava quente. Muito quente! E meus pés estavam soados e então corri para o banheiro. Depois fiz um café forte, acendi um cigarro e liguei o aparelho de música, e deixei o som soar enquanto colocava uma coberta como cortina na droga da janela.
Quando me dei conta já era quase noite, que é quando a vida realmente começa, quando os perdidos encontram um rumo, quando os cigarros começam a valer a pena, e as pessoas não se olham, e eu ando sem precisar fechar os olhos. Saí do meu cubículo e dei uma volta no quarteirão, passei em frente a igreja e encostei numa praça logo em frente. Não havia ninguém, só uns pombos felizes comendo as migalhas de salgadinho. Quem dera eu estar bem como esses pombos. Havia tempos que não encontrava comida por aí. Minha única refeição no dia fora um copo de café e uma rosca que encontrei no fundo da gaveta. Mas não estava com fome, porque os desgraçados cheguam a um ponto onde se alimentam da própria fome, e não sentem mais o estômago depois de tanto tomar vinho, e o cigarro é uma boa janta, e as vezes encontra-se uma fruta jogada na calçada e tudo fica bem. De repente começa a chover, e as coisas começam a melhorar. Prossigo andando para molhar um pouco e sentir a verdadeira sensação de alívio: banho de chuva na noite. É bom para qualquer desesperado. Eu estava com um velho livro no bolso. Mas o sol resolve isso depois.
Mas isso tudo é para se ter inspiração. Porque de nada serve viver sem tê-la. Os dias passam a serem maiores e mais vazios, sem sentido. A inspiração ajuda a modificar esse estado de inutilidade. O inútil com inspiração é um gênio indomável. O inútil sem inspiração é um livro em branco. Experimente ouvir um rock com o som de uma bela guitarra distorcida.... Pavement... Pavement. Para fazer qualquer coisa é preciso dela, para dormir, para acordar, para fumar, para ler, para morrer.
Voltando para o meu cubículo encontro um cachorro na rua sorrindo e lambendo as patas. Tudo isso não passa de uma fuga de mim mesmo. Chego no cubículo, tomo mais café, jogo o livro molhado no chão, e deito com as costas para baixo e olho o teto no escuro... Não há estrelas hoje. E durmo, durmo, durmo...