Mãe
Oi. Não sei como começar uma carta sem destino definido.
Só sei que se eu soubesse que teria que esperar pelo infinito e pela deserta imensidão do espaço para chegar até você eu teria...
Teria te abraçado mais, te cheirado mais. Nunca disse eu te amo olhando no olho. Não era nosso costume.
5 anos é tempo curto para aprender a falar sobre sentimento. Não sabia o que era morte. Só vi você sumindo debaixo das pétalas que voavam da minha mão.
Só pedia que voltasse para apartar o que eu não sabia enfrentar. Sentia o vazio do vazio. Era uma falta de algo que eu pouco sabia ou conhecia. Falta da lembrança do gosto da comida. Vazio que não se preenche, só deixa ser.
A voz que não me vem à memória. O cheiro que não lembro sentir. Os cartões que não tinham dia das mães para existir.
O calor do abraço que só pude sonhar depois dos 20. Um ar sem respiração.
Ano após ano, a falta do que desconheço. A couraça que me envolve para seguir.
Maio é triste. Sem bolo e sem cartão. Janeiro foi o começo e também o fim. Foi ali que conheci o véu. Ele separa, apaga, enfraquece.
Eu não quis ver de perto. Mas o véu chegou e não era o do casamento aos 22, nem do mosquiteiro das meninas.
Tanto fez pelos seus. Por que não deixou cartas?
Acreditava que iria passar, já que pedia tanto para ficar. E ficou...
Nas leves marcas do meu rosto, no olhar da irmã, no caderno de tricô.
Hoje sou carne, mas quando eu te encontrar, e vou, quero ser alma de criança, ser filha, sentir teu cheiro e o calor do teu abraço.