Rua da Esperança.

RUA DA ESPERANÇA

Quem nunca se levantou da cama quentinha, durante a noite, na madrugada, nunca teve noites mal dormidas, nunca ficou perambulando ao redor da cama, pensando no que poderia estar acontecendo lá fora, por causa do barulho oriundo do latir dos cachorros da vizinhança, pode considerar-se contemplado.

Bem, em muitas e muitas vezes durante a noite, levanto-me para olhar, da minha janela, o porquê desses latidos estremecedores que os cachorros da vizinhança fazem, durante as madrugadas. Olho através dela e percebo nada mais, nada menos, do que um bando deles andando em frente a minha casa, irritando, se exibindo para os cães que ficam presos dentro dos cercados dos moradores de minha rua. Pois bem, farei então uma viagem pela madrugada, para ver o que acontece nessas horas, em que todos descansam, a lua brilha quando o tempo está bom, as corujas cantam, os passarinhos se escondem do frio e os cachorros, ah os cachorros aproveitam para passear botando os rabinhos para cima, dando o ar de suas graças, fazendo com que os que estão presos pareçam malucos.

Sim, era uma obsessão o desejo de saber o que acontecia naquelas madrugadas terríveis de sono perdido e noites mal dormidas. Abalaram-se os nervos, os ânimos e, de fato, estava decidida a fazer aquela viagem rumo à resposta.

O relógio bate às 12:30 da madrugada, e o barulho dos latidos estão insuportáveis, levanto-me, coloco o roupão e parto em direção à janela, como faço habitualmente. Mas, dessa vez era diferente. A expedição que eu decidira fazer me levaria a outro rumo, a outro caminho. Vou em direção à porta do meu quarto, passo pelo corredor estreito e frio, me deparo com minha sala e, logo em seguida, com a porta de saída, que dá na direção da garagem da minha residência. Chego ao portão, sim, ao portão, lugar onde os terríveis e barulhentos cães passam suas horas a me perturbar com seus latidos, como que quisessem me provocar. O engraçado nisso tudo, é que os donos dos cachorros dormem, como se nada daquilo estivesse acontecendo, mas eu não, eu não dormia.

Estava decidida, a busca pela descoberta teve início às 12:45, quando “de cara” já espantei, no mínimo, cinco cães barulhentos e alvoroçados. A noite estava fria e clara, porém, o céu estrelado, dava a entender que era lua cheia, o que, de fato, atiçava ainda mais os animais. As casas todas escuras e fechadas, dava-me sinal que todos dormiam, exceto eu, que viajava em minha própria rua, sem ninguém perceber. A única coisa que via nas casas era a fumaça que saía dos fogões a lenha. É tradição fogão a lenha, não apenas na minha rua, mas na cidade toda. A rua onde moro, chama-se Madalena de Barba, sim, é Barba, e não Borba, como muitos pensam ser, (não sei se foi erro de cartório, mas é assim). É um bairro simples, as casas que aqui existem, são casas antigas de fábricas que haviam há muito tempo atrás, e que hoje foram compradas pelos moradores, por um povo pobre, por isso, acredito ser isso a explicação da existência de muitos cachorros. Diz um ditado, que quanto mais pobre for, mais cachorro se tem, (é uma crença). Não que eu odeie cachorros, mas também não os amo.

Assim, eu começo a perceber que em cada casa, todas muito juntas, havia no mínimo, dois cães e uns cinco gatos também, e, quando um cachorro latia, outro também latia, outro acompanhava e outro queria latir mais forte ainda. Parecia uma competição de latidos. E minha pergunta era: como aquela gente podia dormir com tanta competição de latidos? Essa é uma resposta que ainda estou para descobrir. Quando cheguei na entrada da minha rua, eis que surge uma resposta pra minha dúvida lá do início de minha humilde viagem. Uma cachorra, isso mesmo, fêmea, e um tanto deles ao redor da querida e bela cachorrinha. Voltando ao início novamente, era noite de lua cheia, céu estrelado, já sei, tinha minha resposta. Uma cachorra no cio, se mostrando, se exibindo aos barulhentos ao redor dela. E claro, os machos disputavam a conquista enquanto os que estavam presos se irritavam com aquela faceirice toda dos que estavam soltos e, creio que por isso, precisavam pelo menos chamar a atenção da fêmea de alguma forma, era a lei da natureza.

Minha viagem, na qual já havia encontrado a resposta da missão, começara retorno. Um retorno decepcionante, sim decepcionante, pois havia encontrado a resposta, mas não a solução. Como disse, é a lei da natureza, e a natureza dos cães é essa, e a todo o momento vai haver uma cachorra esperando por um belo e forte cachorro, a conquistá-la, e os que estão presos continuarão a se irritar por não poder participar da competição. Em meio a tanta esperança que eu tinha de acabar com as noites mal dormidas, acabara com resposta, mas não com o problema, e creio que muitas e muitas vezes ainda terei que viajar entre minha cama e minha janela, para ver se o latido refere-se apenas às belas e formosas cachorras se decidindo por um par, ou se diz respeito a outro motivo, que me levará a fazer uma nova expedição, do meu quarto até a entrada da minha rua, nas madrugadas afora.

Viviani Borghezan
Enviado por Viviani Borghezan em 13/08/2018
Código do texto: T6417873
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