Armadilha
Acordou sobressaltado no meio da madrugada com um rugido frenético atrás do criado mudo. Abriu os olhos cansados, ainda tentando acostumar-se com a escuridão que dominava o sóbrio dormitório. Acendeu o pequeno abajur, afastou o móvel do lugar e se deparou com um casal de baratas copulando. Assim que deram conta do bisbilhoteiro, as pequenas namoradeiras fugiram sorrateiras para algum cantinho seguro por baixo da cama.
Quanta ironia! Soltou uma gargalhada desdenhando da própria solidão e voltou a dormir.
No dia seguinte saiu cedo de casa. Andava distraidamente pelo centro da cidade. O velho cinema cultural exibia uma matiné de alguma obra romântica antiga. Olhou de soslaio para a fachada, seu olhar cruzou cegamente com o de uma mocinha também solitária. "Até que seria bom espairecer a cabeça com um bom filme", pensou. Desistiu e seguiu intrépido e apressado para o seu destino.
À noite, depois do sucesso das compras do dia, espalhou iscas de pesticidas por toda a casa. Sorriu satisfeito. Agora, barata nenhuma fará troça de sua carência.