Falar do passado, principalmente do rádio antigo, é manter contato com a saudade

FALAR DO PASSADO, PRINCIPALMENTE DO RÁDIO ANTIGO, É MANTER CONTATO COM A SAUDADE.

Quem diria! Aqui estou eu, revolvendo nos alfarrábios de minha memória, instigado por um concurso que teve o mérito de fazer-me viajar no tempo e reviver inúmeros ídolos e emissoras que, por suas programações variadas e inteligentes, atendiam às exigências de um povo brasileiro, sequioso por adquirir conhecimentos e manter-se informado sobre o quotidiano de sua tão adorada pátria. O rádio é, sem dúvida, o meio de comunicação capaz de propiciar-nos a criatividade, liberando cada ouvinte para que forme suas próprias imagens no decurso das histórias e programações, tão bem conduzidas por locutores de extrema capacidade.

A era de ouro do Rádio Brasileiro, começou nos primeiros anos da década de trinta, onde o “speaker” (locutor) praticamente carregava os destinos da emissora, acabando mesmo por tornar-se, marca registrada da mesma. Um evidente exemplo disso foi César Ladeira, iniciado na Rádio Record e que, transferiu-se para a Rádio Mayrink Veiga do Rio de Janeiro. Nessa década, as programações eram de grande duração e com muitas variedades. Normalmente tinham 3 a 4 horas, como o “Programa Casé”, da Rádio Transmissora do Rio de Janeiro. A Rádio Nacional do Rio de Janeiro, era a líder em audiência e por mais de década, seus programas apresentavam cantores como Francisco Alves e Vicente Celestino; humoristas como Lauro Borges com suas “Piadas do Manduca” e Silvino neto com o personagem “Pimpinela”; programas de calouros como a “Hora do pato”, conduzido por Heber de Bôscoli, entre outros. É no final da década que o Rádio experimenta sua máxima expressão, com numerosas emissoras sendo criadas e espalhadas pelo Brasil. Não bastassem a Rádio Nacional e a Tupy disputando audiência, conviveriam com a Rádio Club, a Cruzeiro do Sul (SP. e Rio), Rádio Jornal do Brasil, Cultura (SP), etc.

Os auditórios das emissoras cresciam em suas dimensões para receber um público sempre maior e participante. A Rádio Tupy, por exemplo, marcava época com Manuel da Nóbrega e Aluísio Silva Araújo no programa humorístico “Cadeira de barbeiro”. Cantores, orquestras, duplas, trios e músicos, desfilavam nesses auditórios, juntamente com programas de calouros onde, os candidatos eram criteriosamente julgados. Traz-me a lembrança, o “Calouros em desfile”, dirigido com maestria pelo imortal compositor e apresentador Ary Barroso; o “Papel carbono” apresentado pelo Renato Murce e o “Trem da alegria” do César de Alencar, já nos anos 40.

O rádio-teatro, iniciado no fim dos anos trinta, trouxe consigo os contra-regras (profissionais responsáveis pela criação dos sons que complementavam e davam maior força aos textos, tais como: cavalgar de cavalos; trovoadas, chuva, portas se abrindo, etc...). Logo ocuparia grandes espaços e seus textos e ídolos, multiplicar-se-iam para atender às diversas faixas etárias. Surgiam os heróis de época, recrutando ouvintes de 7 a 15 anos, destacando-se “O Anjo”; “Capitão Atlas”; “Zorro”; “Jerônimo o herói do sertão” que, apresentando as virtudes da verdade, justiça e honestidade, mostravam aos nossos pré-adolescentes, invariavelmente, a vitória do bem sobre o mal (não seria interessante continuar-se com esse procedimento? ). Também, as rádio-novelas, aí se instalaram.

Acompanhando essa década, a “Pequena notável”, Carmem Miranda, reinava nos microfones e levava o nome do Brasil para o exterior, exercendo o papel de embaixatriz, das mais eficientes. Tanto que, após a filmagem de “Banana da terra”, contracenando com o “Bando da Lua” e interpretando de Dorival Caymmi, “O que é que a baiana tem? “, foi contratada por Lee Schubert, indo para o Estados Unidos, onde marcou época, para delírio daquele povo. Cantores e cantoras surgiam e continuavam a fazer repetidos sucessos por anos e anos, chegando ao início da década de 50 quando, a televisão viria modificar o panorama artístico brasileiro. Seresteiros, sambistas, duplas sertanejas, trios, orquestras, davam ao nosso povo uma alegria que hoje, lamentavelmente, não mais está gravada em nossas faces. Tínhamos um povo sofrido, mas esperançoso, patriota, responsável, honesto, fraterno e acima de tudo, de feições alegres. E hoje? É sofrido, carrancudo, desconfiado, pouco patriota, inseguro, de pouca esperança, frágil ao ponto, de não encontrar forças para defender seus direitos e liberdade e pior, de feições extremamente tristes.

Entre os cantores, cantoras, compositores, músicos e orquestras, fazendo uma rápida visita ao subconsciente, ainda encontro: Francisco Alves, Mário Reis, Orlando Silva, Silvio Caldas, Nelson Gonçalves, Lamartine Babo, Marlene, Emilinha Borba, Jararaca e Ratinho, Alvarenga e Ranchinho, Trio de Ouro ( Herivelton Martins, Dalva de Oliveira e Nilo Chagas), Almirante, que após iniciar-se como cantor, imortaliza-se com seu “Caixas de Perguntas” , programa de competição, de inteligência e o “Incrível! Fantástico! Extraordinário”, onde eram apresentados casos sobrenaturais, Silvinha Mello, as irmãs Linda e Dircinha Batista, os maestros Francisco Mignone, Radamés Gnatalli. Gabriel Migliori, Gaó; apresentadores como César Ladeira na Rádio Mayrink Veiga, Saint-Clair Lopes na Educadora, Porto Carreiro no Programa Nacional, Carlos Frias na Cruzeiro do Sul, entre outros. Perdoem-me todos os demais não citados e igualmente merecedores de serem por nós lembrados, porém a riqueza, fartura dessa época do Rádio Brasileiro, não cabe de forma nenhuma, por mais competente e sucinto que seja o cronista, no espaço dessas páginas. Outrossim, estou eternamente grato por essa oportunidade de poder rever no passado, tantas coisas boas e saudáveis que fizeram desse nosso povo, um místico, exclusivamente de esperanças e alegrias. Ah, contatos com a saudade! Que bom!