FUJA SE PUDER...
É difícil lutar contra os padrões sociais. Vivenciar os estigmas da velhice pode ser um fardo pesado. Tem gente que sente estar à beira de um ataque de nervos. Quem sabe não é motivo para se tornar um velho rabugento? Alguém consegue convencer que está se lixando a cada ano que passa, pois o tempo é finito, um dia vai acabar? Não, porque há o apego aos bens materiais e afetivos. Ninguém quer perder nada.
Apesar do apego à vida não há nenhuma lógica em querer que o tempo pare. Ainda no espaço tudo bem. Não é fácil mudar, pois leva dinheiro e cansaço e, depois, é como começar de novo. Mas é realmente um recomeço? Talvez sim ou talvez não, mas se pode voltar atrás caso não se sinta bem. Com o tempo é diferente: não adianta fazer plástica, não adianta lipoaspiração, dieta e perda de peso – mais cedo ou mais tarde – ele chega com ela - para dar um basta à mania humana de se imortalizar.
Tem casos que servem como catalisadores deste estado de espírito. Quanto idoso não tem o desprazer de ouvir outro idoso que lhe diz de forma direta:” você está velho hem?” Com homem é comum, pois em sua maioria têm a síndrome de Peter Pan. Assim camuflam sua idade sacaneando o outro que é de sua geração. O vínculo aos padrões sociais que marcam o velho é tão forte que apaga a solidariedade ao próximo. Arrisca-se a dizer que o preconceito é mais forte entre os pares que entre aqueles de geração mais nova. É mai relevante ser mãe ou pai do que ser avó ou avô. Melhor é sempre elogiar o novo, pois faz parte do consenso e está distante do fim.
Alguns lances que acontecem no metrô estimulam a imaginação. É frequentado por eternos garotões e por falsas jovens que vivem negando a idade a qualquer preço: “imagina que vou deixar meu cabelo branco, nem pensar”. Várias dessas passageiras, caso o trem esteja cheio, cedem o seu lugar no banco à outra mulher, desde que tenha cabelos grisalhos. Se a pessoa não está debilitada por que tanta gentileza?
O lado feminino é estimulado a competir por beleza, mas parece que na velhice há certa convergência com o lado masculino visando atingir o próximo em seu ponto fraco. Ambos querem ser conservados escondendo todos os sinais mesmo que estejam evidentes. O que se pode deduzir é que os dois sexos estão influenciados pelo descarte do ser humano – a ponto de colocar como alvo de suas frustrações – o seu espelho. Por isso é bom fugir do estigma como puder. Se a maioria sempre foi tangida pelo espírito de manada esses comportamentos são até previsíveis, mas quando afetam sua própria pele é que se pode sentir o quanto se é hostilizado com base nos clichês – velho é feio, velho babão, velho é inútil, velho fede, velho como saco de pancada. Muito longe da época em que o velho era símbolo de respeito e sabedoria.
O futuro agora é como um carrossel girando sem parar, rápido e descartável. Apenas reservado às pessoas. Aquele que puder resistir à ditadura da vontade que, insidiosa penetra nos corações e mentes terá a oportunidade de refletir sobre o combate ao mito da juventude e da beleza. Esse mito não tem o poder da Fênix de ressurgir das cinzas, revigorada, mas pode mutilar homens e mulheres em busca do corpo perfeito. Em tal situação, os praticantes deste modo de ser podem afirmar que “a vida é curta”. No aqui e agora, os homens foram condicionados ao voluntarismo, que é uma filosofia apropriada a pensar o mundo desprovido de prática social transformadora. Tudo está centrado no individualismo – dos valores aos sonhos. Os mais novos cultuam a boa forma física e os mais velhos procuram burlar os efeitos que a idade produz nos corpos. Quase todos querem escapulir dos efeitos da passagem dos anos. Porém, insistir na lamentação das perdas – do viço e da força física – como um sacrifício necessário para barrar alternativa pior, é juízo de valor que exalta a vida como o bem mais valioso. Será que este é o caminho ou mais um engano? Assim se repete o que se colocou no início fechando o ciclo. Diante dessas indagações sobre o paradoxo humano melhor é começar a pensar que a vida é longa.
É por estas e outras que é importante voltar ao tempo que é finito e deixar de pensar no lugar- comum dos feitos da mocidade. Afinal se a juventude não fosse tão valorizada todos perceberiam a sensatez da natureza que frente ao mundo desprovido de generosidade e compaixão, reservou a morte como antídoto. Será que não há mérito nas seitas e religiões ao adotarem o discurso único da morte como salvação do espírito? Se não há mudança da essência humana ao longo do curso da história, se não se quer absorver a cooperação como conduta entre as pessoas pode-se concluir que o sentido da vida é a morte.