O Homem que Passa
Durante uma pequena reunião de amigos passou por nós um senhor que, cordialmente, nos cumprimentou. Todos o saudamos com muita afetividade. Ele deveria ter por volta de 65 anos, aposentado e com uma situação tranquila. Então, um dos nossos amigos disse:
“-Como será a vida deste senhor? Compra o pão, depois o jornal, e segue seu caminho.....” Ele ainda disse:
“-Eu não aguentaria tamanha monotonia.”
Então, foi quando eu lhe disse:
“-Você está muito enganado, pois este senhor está desempenhando um grande papel nesta história, que é a vida. Todos nós somos grandes atores, ou grandes atrizes. Quando nascemos o destino nos reservou uma grande peça para representarmos. Entretanto não recebemos o enredo por escrito e ai vamos fazendo o melhor que podemos. Quem sabe se ao fim não ganharemos um Oscar, um Saci, um Moliére, por nossas atuações.
Neste momento todos os meus amigos pararam e disseram que eu tinha razão. Por exemplo, o Luiz disse:
“-Quando eu era jovem. eu queria ser aviador e hoje sou aposentado como eletricista, é tudo o que eu tenho ganhei operando máquinas elétricas, e estou feliz.”
Os demais também explanaram que suas profissões eram bem diferentes daquelas que eles tinham em seus pensamentos originais.
E aí o Luiz me perguntou qual era o meu desejo de infância?
“-Eu queria ser médico. Pós quando tinha 6 anos fui com minha mãe a um consultório médico para me aviar uma receita, para algum fortificante, pois eu era meio fraquinho para a minha idade. Mas enquanto esperávamos ser atendidos chegou uma jovem senhora com um bebê nos braços. Ela queria que o médico receitasse algum remédio para seu filho que não estava bem. Entretanto, a secretária do médico disse para a jovem mãe:
“-Ele não pode atender seu filho porque o médico só atende pessoas funcionárias da Companhia Mogiana de Estradas de ferro.”
Ela ainda disse à moça:
“-Vá à assistência pública que eles te atendem.”
Então, a senhora chorando, cobriu seu nenê com a sua blusa, e saiu na chuva que estava caindo. Naquele momento eu resolvi que quando crescer quero ser médico. E atenderei a todos que eu puder.
Mas o tempo passou e quando cheguei a idade de estudar para médico meu pai, que sabia dos meus sonhos, me disse:
“-Laércio! infelizmente eu não posso fazer você estudar medicina. foge das posses de um torneiro mecânico, como eu.”
Como já disse, pois no destino e que dirigem as nossa vida. Por isso temos de ter um temperamento flexível. Assim, procurei fazer uma coisa da qual eu gostava. Depois de muito trabalhar como foguista de locomotivas a vapor, depois nas locomotivas diesel elétricas e mais tarde, como maquinista, eu me realizei, também. E aquele sonho da Medicina ficou repousando no subconsciente.
Certa vez, em Ribeirão Preto, eu morava numa república junto com vários maquinistas. O local era muito pobre, muitas famílias moravam nas imediações, com muitas crianças. E passei a ser alvo de várias mães que vinham me procurar para uma orientação sobre o que fazer para seus filhos, sobre algumas doenças que as acometiam. Nessa altura, eu já tinha me desenvolvido no espiritismo kardecista com meu tio João Gardinali, que também fora maquinista. Sempre tinha intuição para tudo.
Certa vez um menino de 10 anos rasgou a perna da coxa até o joelho e a mãe do menino me disse:
“- O que eu faço com meu filho? Olha quanto sangue?”
Com muita intuição, eu falei para a mulher:
“-Depressa, abra um monte de feijões jalo que estão naquela tigela com água.”
E eu fui com uma toalha estancar o sangue do garoto. Assim que ela me dava um feijão aberto eu colocava sobre o corte, e assim estancamos o sangue. Aí eu disse:
“-Vá ali na esquina, telefone na venda e peça para a ambulância vir aqui.”
Como era uma terça-feira, às 10 horas da manhã a ambulância chegou e o médico, um senhor de uns 60 anos, me disse:
“- Meus parabéns pela iniciativa. O senhor teve uma intuição extraordinária pois o corte do garoto é muito fundo.”
Ainda me disse:
“O senhor é só maquinista?
Depois de aposentado tive mais tempo para me dedicar ao espiritismo. Que já fazia em Campinas, e em Ribeirão Preto. Sempre assistido por grandes médicos espirituais. Como em 1960 quando foi vitimado com muitas queimaduras, quando eu socorri amigos de outro trem, em Mogi Guaçu. Fiquei quatro meses no hospital, mais quatro meses em casa para voltar ao normal. Mesmo todo queimado eu sentia a força espiritual ao meu lado. Também várias vezes o meu espírito foi orar por uma moça que sofria muito o que fizeram nela. Ela me chamava:
“- Laércio! vem me dar um passe que eu não aguento mais.” Então eu sentia que ia ao quarto dela e ela dormia. A Suzana era esse o nome da moça. Depois dos meses que nós já estávamos podendo andar, ela me disse:
“- Você se lembra quando eu chamava você e você ia me dar o passe? aí eu dormia?”
Então eu disse a ela:
“-Eu também vi você. Só que naqueles dias eu também não podia me locomover, pois estava todo amarrado na cama com grandes queimaduras. Mas eu sei que nós podemos fazer isso em ocasiões especiais.”
Por isso que eu digo sempre somos eternos atores ou atrizes para desempenhar o papel que a vida nos reserva.