Desacelere

Ainda a pouco estava a pedalar vindo pro serviço. Ora acelerava o passo, ora desacelerava. Sentia minhas pernas sendo fortalecidas. Sentia o vento frio nesta manhã de inverno. Sentia que Deus cuidava de mim. Sentia-me bem. Enquanto sentia todas estas "coisas simples", também refletia sobre o quão acelerada está a nossa vida hoje, refletia sobre meus próprios problemas, que não são poucos, mas como ouvi, um dia desses, alguém dizer: "se pudéssemos empilhar nossos problemas sobre nossas cabeças iríamos olhar pros problemas dos outros e preferir a pilha dos nossos". Assim me contive.

Então me lembrei de tantos amigos que também enfrentam dores. Me lembrei dos meus pais que hoje não têm mais a saúde que antes tinham, me lembrei de tantas histórias, porém uma, me era, por demais, latente em minha mente. A história do Eder, meu amigo de infância. Quantas vezes corremos acelerados juntos atrás de uma bola de futebol, quantas vezes sorrimos juntos com piadas. Nos alegramos juntos tocando violão e cantando algumas canções de nossa época. Enfim, sempre torcemos um pro outro embora na fase adulta cada um tenha seguido seu próprio caminho -acelerado. Ele mora em outro estado hoje.

Com o advento das redes sociais sempre acompanhava seus posts de corridas e exercícios que ele vinha ultimamente fazendo, por ser um cara da geração saúde, essa que anda acelerada demasiadamente. Porém uma de suas últimas postagens, essa que me tirou o chão me desacelerando por uns segundos, muito dizia sobre o quanto nossa aceleração nesta vida às vezes pode estar tão descontrolada quanto perigosa, apesar de que os termos descontrole e perigo sejam quase sinônimos faço questão de os dissociar. Meu amigo, pedia oração neste seu post derradeiro, pois fora acometido de um acidente motociclistico onde veio a ter sua perna esquerda amputada. Isso mesmo, meu amigo, que levava uma vida última, acelerada, teve a mesma, desacelerada por um agente de perigos que ele não pode controlar.

Após ter lido um de seus relatos recentes acerca das experiências que ele tem vivenciado e ainda após ter ligado pra ele e ouvido dele mesmo o quanto ele tem reunido energias pra, ao invés de lamentar, se adaptar à sua nova vida; ao invés de odiar o cara bêbado do carro que o atropelou, não ser inerte às impunidades; ao invés de se render à tristeza, ter um coração grato à Deus que ainda lhe poupou a vida, pois afinal de contas o mundo é contingente e nossas mazelas em nada tem a ver com Deus se não nossa falta de gratidão para com suas misericórdias. Mesmo em meio ao caos existencial em que estamos inseridos.

Após tudo isso digo:

Sua vida vale mais que seus anseios

Os fins não justificam os meios

Desacelere quando não for uma urgência

Desacelere, tenha paciência, inteligência para degustar cada preliminar dos prazeres maiores

Tenha competência para enxergar o simples, os pormenores

Antes que eles sejam complexos demais

Antes que do simples sinta falta como jamais

Cuide de quem te ama, ame a todos quantos encontrar pelo caminho

Assim, jamais estará sozinho

E antes que seja preciso um agente perigoso pra te desacelerar

Seja empático com os problemas dos outros, eles podem te tocar.