Crianças podem ser chatas ...às vezes !
Me lembro bem de uma coisa que nos desagradava bastante, ao meu irmão e a mim , embora nunca falássemos disso entre nós. Era o fato de outras crianças insistirem para que falássemos em espanhol, qualquer coisa, ou ficassem nos entrevistando e martelando : " Como se diz cachorro ?", " Como se diz estou com fome " , " Estou com frio , com sede" , ou qualquer outra bobagem assim...
Eu estava com oito anos e o meu irmão um pouco maior, e com cara de poucos amigos raramente respondia, mas eu tentava ser simpático , um pouco para me enturmar e muito para me livrar dessas perguntas chatas de uma vez.
Esconder a forma de falar, impossível, ficar mudo o tempo todo também não era o objetivo, pois crianças querem brincar com outras crianças, e nós éramos normais.
Meu irmão era de pouca paciência, não provocava ninguém, não era o seu estilo, mas estava sempre pronto a responder ao primeiro desaforo, e soltar um soco bem no meio do nariz (seu lugar preferido), era questão de minutos, e sem avisos. Aprendi cedo a contornar situações que poderiam acabar mal, mas não para nós, pois nos dávamos bem, mas sim para terceiros.
Quando vinham essas perguntas, chatas e seguidas, eu tomava a dianteira de responder, mesmo sem entusiasmo, sob o olhar carrancudo do meu irmão, que às vezes respondia " Não interessa", quase me recriminando por eu aceitar responder. A verdade é que iniciar uma nova vida em outro país tem seus ossos para roer, mesmo que para as crianças.
O que para nós era normal na Espanha, aqui era novidade, tínhamos muito para aprender, a começar pelo idioma.
Não posso ser injusto, as crianças aqui são mais receptivas e prontas à aproximação, é claro que tinham a curiosidade , natural para a idade, afinal éramos realmente diferentes, mesmo que não soubéssemos lidar bem com isso.
Os meus pais sempre incentivaram o convívio, e nos diziam coisas sobre as pessoas serem iguais, e permitiam que outras crianças brincassem conosco no quintal ou na rua de terra. Nos enviaram à escola nos primeiros dias, quando não sabíamos falar nada em português, me lembro bem, e não foi nada fácil, embora compreensível.
A vida não tem ensaios, como todos sabemos, e os métodos vieram muito depois da praticidade e ainda mais da necessidade.