AO AMIGO BERNARD GONTIER. SAIR DO PAÍS.
Vim à casa amiga e encontro a vida em ebulição, dos amigos de passaporte em punho. De cabeças enriquecidas pelo mistério de abraçar o mundo. O móvel que movimenta entristece.
Creio que vivemos em meio a uma seriedade hermética pela visão de sua ausência, e a fuga traria o que todos procuramos, a paz. Ela traz o sabor das pequenas coisas da vida sem sobressaltos.
Nada que faz poucos anos por muito pouco, um celular, roubasse na esquina da surpresa, a vida. A vida envelopada na lei como bem máximo vale nada mais que um celular apossado por quem já não tem vida, a droga que move a vontade em corpo que mata por já estar morto.
Nenhuma inocência que chegou ao mundo nas vestes da criança ganha corpo e mata. A inteligência mínima não mata. Matam os que deveriam formar as inocências e lhes retiram direitos fundamentais. E continuam a saga cínica da indiferença lavada de deboche, afronta da consciência de justiça.
E ela, a paz perdida e procurada, sem que percebamos com muitos detalhes, é jurídica. O direito é tudo um.
O que se procura?
Nossos principais bens tutelados, mas fora do alcance de todas as moléstias civis e penais, tutela que lhes garantiriam a segurança do direito, do Estado de Direito. Estamos todos sequelados pela gigantesca insegurança que nos chega reportada e vista. O pior, falta esperança. Horizonte perdido.
Quando se foge não há mais alternativa. É como faltar Deus, quando falta Deus falta tudo.
‘Não se opor ao erro é aprová-lo”, diz Tomás, por que o “mal não é necessário”, ratifica o Santo fundador da escolástica, por sua voz referido.
Mas devemos antes de chegar a qualquer lugar chegar em nós mesmos. É legítimo querer paz, mas é necessário lutar por ela. Também iria para a Terra dos Medicce, se pudesse fugir de meus vínculos com o chão onde nasci, mesmo que tenha, como ainda agora brincou minha neta, batendo no braço como faço e dizendo, “tenho sangue da renascença”.
Florença, a Firenzi da maravilha para os olhos,de Bruneleschi e tantos outros, o arquiteto que desafiou a gravidade primeiro, a beleza que ninguém mais trouxe e trará igual, onde se tropeça nas ruas em arte. Mas conhecer sem fugir, ir por quantas vezes possível for, deleitar-se, ficar um bom tempo, mas voltar.
Essa fuga é a imagem da mesma fuga dos refugiados de outras pátrias por guerras, fome, pobreza, falta de oportunidades, mas que também trouxeram aos direitos tutelados dos europeus instabilidade, insegurança. Só muda o grau de intensidade e abrangência, em todos os solos, algumas poucas ilhas de paz relativa no mundo.
O homem, no fim, está fugindo de si mesmo. "Gostamos das ortoépias mutantes..de nossos corações...das prosas”, fica difícil fugir de nossas amarras, da essência das águas placentárias que nos fizeram aportar aqui ou ali. E mesmo achando a relativa paz em outro espaço a ausência da paz de origem marca de saudade todos os dias.
Um dimensionamento do curso dos dias atuais com a sua sempre minudente observação.