CRÔNICAS DO HOSPÍCIO 2.
Hoje é quarta-feira, o dia está extremamente quente, nunca em minha vida tinha sentido tanto calor como estou sentindo agora. Estou novamente ao pé da frondosa árvore, que sombra maravilhosa ela me proporciona, os pássaros vêm aninhar-se entre seus muitos galhos, gosto de observá-los, admirar a maneira como eles voam, da forma como tratam de seus filhotes, tudo magnífico.
O meu anjo ledo também gosta de pássaros, deve ser pelo fato de ambos terem asas para voar, fico imaginando como deve ser bom poder voar, passar por entre as nuvens, sentir o vento batendo no peito, dar rasantes e depois subir ao mais alto que puder. Hoje é meu aniversário, não quero revelar a minha idade, isso também pouco importa agora. Tivemos um dia daqueles aqui no sanatório, o Ulisses, que diz ser Dom Quixote, fez da sua cadeira um cavalo e começou a gritar pelos corredores dizendo: "Temos que combater esse monstro, temos que destruir o cavaleiro da estrela vermelha, eliminar sua ameaça, avante homens, vamos ao combate, vamos para as ruas". Assim foi nossa manhã, houve um tremendo alvoroço por causa disso, mas confesso que gostei muito, foi muito divertido, estava aponto de seguir o Ulisses, ou, como ele mesmo disse. "Dom Quixote".
Depois veio o almoço, a mesma gororoba de sempre, só por que somos taxados de loucos, não significa que temos de comer como animais, do meu ponto de vista, nem para cachorro serve uma coisa dessas, mas enfim, nossa fome é sempre maior e acabamos por comer tudo. A sala do refeitório é enorme, cheio de cadeiras e mesas, tudo de plástico, do mais barato possível, que é a maior porcaria, vive quebrando, antes eram de madeira, retiraram depois de inúmeras brigas, entre o duende verde e o homem aranha, permita-me explicar. O homem aranha é o Carlos o duende verde o Lucas, eles estão sempre brigando.
Na parte da tarde eu fico aqui, ao pé da frondosa árvore, às vezes eu até consigo vê-la, com suas asas enormes e seu rosto lívido, a luz que irradia do seu corpo é a coisa mais bela de se ver, se todos pudessem ver o que eu vejo, eu não estaria mais aqui, é uma pena, um planeta tão grande feito o nosso e ninguém conseguiu ver um anjo, ou o meu dom é único, ou, minha loucura também seja única, isso não importa também, seja o que for, será só meu unicamente meu.
Gosto quando você aparece à noite, me faz sentir tão bem, tenho sentido sua falta durante as minhas noites, os meus devaneios tem sido constantes, os médicos me aplicam remédios tão fortes que me fazem dormir a força - não demores amor da minha vida, quero poder comprovar a todos a sua existência meu anjo ledo, quero sair desse lugar horrendo e trazer para ele o resto do mundo - esse sim é maluco, com tantas esquisitices. Adeus amor da minha vida estarei aguardando ansioso a carta que você me prometeu, aqui na terra temos o costume de dizer que promessa é dívida, sendo assim você está me devendo uma carta, Adeus anjo ledo.