A primeira Olivetti a gente nunca esquece
Lembro dos três melhores presentes que já recebi. Me foram dados por meu pai. Também lembro do presente que ele nunca me deu.
Quando, eu e minhas irmãs, começávamos a dar trabalho à mamãe ele sempre nos prometia uma boneca que falava, que sorria, que fazia cocô e xixi. Não precisava brigar, castigar, era só ele falar na boneca que, então, nos comportávamos, começávamos a ajudar mamãe nas tarefas domésticas, virávamos meninas exemplares. Não preciso dizer que ninguém nunca ganhou essa boneca. Porém não era esse o meu sonho de consumo. Desejava, mais do que tudo, uma boneca com cabelo. Minha boneca era um bebê de borracha, onde o cabelo era desenhado na borracha. Hoje sei que se eu pedisse ele me daria, mas não tínhamos o costume de pedir. Morri de inveja quando ele presenteou minha tia Naide com uma autêntica boneca de cabelo. A Naide andava meio preguiçosa para estudar, dando muito trabalho a minha vó. Prometeu a ela se passasse de ano. Foi aprovada e ganhou a boneca. Como nunca dei trabalho para estudar não fui beneficiada com esse prêmio.
O primeiro melhor presente foi quando completei 10 anos: a coleção “O mundo das crianças”, em 15 volumes. Tinha a capa dura, vermelha e achei a coleção muito interessante. De toda a coleção, o livro que mais me encantou foi a história infantil de uma coelha que morava numa bota com seus inúmeros coelhinhos. Não me lembro da história, pois o que realmente me encantava era a figura da bota com portas e janelas, enfeitadas com cortinas e flores e muitos coelhinhos por toda a parte. Passava horas e horas olhando a figura e imaginando como deveria ser divertido morar numa casinha assim.
O segundo melhor presente foi quando fiz 15 anos: ganhei uma estante, só minha, onde podia botar meus cadernos e livros e, melhor que tudo, tinha uma parte da estante com chave onde eu podia guardar meus segredos, longe dos olhares xeretas dos meus irmãos. Enfim, tinha um cantinho só meu, onde podia me sentar, estudar e sonhar.
O terceiro melhor presente foi aos 18 anos: ganhei uma Olivetti. A geração atual não vai entender o que era ganhar uma Olivetti para quem gostava de escrever. Era como ganhar um notebook de última geração. Me tornei a pessoa mais feliz do mundo. Guardo a minha Olivetti até hoje. A primeira Olivetti a gente nunca esquece.