Mudar de rumo.
Lembro-me como se fosse hoje. Eu tinha dezessete anos, morava em Brasília, e era presidente da UDESB-União Democrática dos Estudantes Secundários de Brasília.Era o ano de 1964 e manter a liderança de um grupo por demais heterogêneo, como aquele era difícil.Saíamos de uma Assembléia onde a tônica fora o desentendimento quanto ao rumo da Entidade. Eu não consegui unidade para os projetos que idealizara e o pior é que ninguém tinha um projeto substituto. Desanimado com tanta dificuldade, pedi então meu afastamento. Antes de levantar pedi a meu irmão caçula, que fazia parte da diretoria, para me acompanhar. Qual foi a minha surpresa quando ele não me atendeu e ainda tentou me dissuadir. Mas eu estava decidido. Saí dali com uma sensação de liberdade imensa e com uma única preocupação:deixar meu irmão, por quem me sentia responsável, em meio aquela turba. Do lado de fora, na Av. W3, havia um parque com uma enorme roda gigante. Entrei nela e ela começou a girar até que parou quando estava lá no alto. Era uma visão magnífica de toda a cidade e ali, naquele instante, dei graças a Deus por haver me livrado da UDESB, e poder começar a viver a minha liberdade. Quando finalmente a roda gigante terminou as suas voltas e saí da cadeira, deparei-me com meu irmão e alguns diretores da Entidade que me esperavam para tentar me convencer a ficar. Chamei meu irmão de lado e fiz ver a ele como seria bom nós nos livrarmos de tudo aquilo e viver a nossa vida. Foi tudo em vão. Ele não arredava pé e insistia para que ficasse. Eu fiquei! Não pela UDESB ou pela diretoria, mas por não querer deixar meu irmão sozinho naquela guerra estudantil. Hoje, passados tantos anos, também sinto vontade, à vezes, de largar uma série de atividades comunitárias para poder, finalmente viver a minha vida em paz e liberdade. Já não é mais meu irmão que me prende, ele seguiu sua vida, mas a responsabilidade por todos aqueles que confiam em mim.Tenho medo de deixá-los órfãos.E assim vou postergando o meu grito de liberdade, sabe Deus até quando.