VIDA DE CACHORRO

- Vem Totó! Rápido. Vamos!

Pediu para que parassem os carros. Sorriu e agradeceu o motorista. Zelosa e cuidadosamente insistiu para que o cachorro atravessasse a rua pela faixa de pedestres.

Vagaroso e despreocupadamente o cãozinho vira-latas, de pelo marrom e pernas compridas atravessou a rua e foi acompanhando seu dono que entre uma lata de lixo e outra fazia suas paradas.

O amigo sempre a sua volta. Fuçando aqui, cheirando ali, cavoucando acolá, procurando algo que pudesse aproveitar para saciar aquela costumeira fome acumulada pela miserabilidade do bolso vazio do dono que, por sua vez, copiava os atos do bichinho.

E vão pela rua afora. Parecem felizes. Um cantava, outro, o rabo abanava. Um assoviava, outro, com um uivo acompanhava. Entre a multidão apressada que se esbarrava pelo centro da grande cidade eram só mais dois famigerados invisíveis sem nenhuma importância.

O sorriso no rosto e o abanar do rabo, invisivelmente, não eram correspondidos pelos mais afortunados de roupas limpas e com bom perfume. Mas isso não importa. É o costume. Claro, as vezes até importa, quando, sentado na calçada, conversando consigo mesmo, não tem o prazer de um simples “oi” ou um “olá, tudo bem”.

A noite chega. A barriga ainda vazia. A cidade deserta. O frio açoitando a pele surrada pelo sol escaldante dos dias de luta pela sobrevivência. Um colchão de papelão com mantas de jornais ou panos velhos, lhe serve de abrigo. E o cachorro? Seu único amigo. Se acomoda ao seu lado, quando não, junto amontoado dividindo o mesmo leito, fugindo do frio, até adormecerem num pesado sono que logo pela manhã é interrompido ao caminhar dos “dignos” da sociedade.

O novo dia é mais uma maratona. Uma correria de lata em lata para catar o resto da janta que lhes servirão de café da manhã. Cão e dono. Um cuidando do outro, tornam-se os melhores e mais fiéis amigos que os abastados da sociedade são incapazes de entender o significado. O dinheiro compra tudo, mas não consegue comprar os mais nobres sentimentos de amor e de amizade que é tão valorizado pelos invisíveis que levam uma vida de cachorro.

Paulo Roberto Fernandes
Enviado por Paulo Roberto Fernandes em 14/06/2018
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