O jogo dos anos de final oito

O jogo é dedicar trinta minutos do meu tempo para pesquisar fatos dos anos " oito" em cada década nos últimos setenta anos. Não poderia ser uma busca por fatos quaisquer. Nada aleatório nesse jogo. Tinha que me revelar. Durante anos, andei sem ter direção certa, ciente disso, contanto que feliz estivesse. Agora o jogo impunha achar conexões ou tomar posições. Procurei fatos que passaram batido de nossa percepção ou lembrança, mas que não deveriam, porque feliz não estou com isso. Coincidentemente, tivemos alternadas copas do mundo de futebol, as quais cada pessoa conhecedora desse jogo, sabe seus destaques de cor nos anos de 1958, 1978 e 1998.

Comecei com a década de quarenta no século XX , quando não tivemos copa do mundo, devido ao maior conflito bélico mundial da história , que fez raças exterminarem outras. Paradoxalmente, temos a vitória do Partido Nacional Sul Africano em 1948 , o qual criou a política da separação racial (Apartheid), no mesmo momento que o Israel e a Coreia do Norte se tornam independentes e perigosamente agressivas. O presidente norte americano eleito neste ano é Henry Truman, outro senhor da guerra, no mesmo ano em que nasce Al Gore, o futuro vice presidente (ou quase presidente) dos EUA , mais precisamente, um ecologista aristocrata que abiscoitou um prêmio Nobel da Paz. Gandhi morre neste ano. Gandhi nunca recebeu o prêmio Nobel da Paz, apesar de ter sido indicado cinco vezes entre 1937 e 1948. As vezes me pergunto se teve alguém neste mundo mais merecedor do Nobel que ele. Ano de tristeza.

Então fui para 1958, o ano que o Brasil ganha nos campos da Suécia sua primeira copa do mundo na goleada de virada por cinco a dois. Entre Garrincha e outros craques, surgiu o garoto Pelé. A taça foi erguida por Bellini, num gesto emblemático e a se repetir por mais quatro vezes. Também outra goleada vem dos céus: os russos inauguram a era espacial com a entrada do satélite "amigo viajante" ou Sputnik III, bem nas costas dos orgulhosos norte americanos. A goleada doeu tanto que, ainda bem, criaram a NASA e o rock. Ano de alegria.

O ano de 1968 não teve copa do mundo. Por outro lado foi o ano da juventude e da rebeldia. Tivemos revelações de florescimentos, emparelhadas com de truculências nos movimentos estudantis de Paris, na "primavera de Praga", na marcha dos cem mil no Rio de Janeiro e na greve de Contagem/MG (Belgo Mineira), esta tida como a "avó de todas as greves de metalúrgicos" e primeira de muitas que emparedaram o regime militar. O movimento Black Power sobe ao "podium" nas Olimpíadas de 68. Americanos matam Martin Luther King Junior nos EUA, o mesmo que recebeu o prêmio Nobel da Paz, aos 35 anos de idade: só Linus Pauling e Judy Willians nos EUA repetiram a façanha com causas humanitárias justas, os demais foram a mais pura politicagem. Ano de tristeza.

Dez anos depois, o ano é 1978, em que a ONU declara o ano internacional Antiapartheid, com Mandela ainda preso, mas sempre vigoroso em busca da paz: o destaque na copa do mundo da Argentina foi o Peru que , grande sensação do torneio, apanhou de seis a zero dos donos da casa, eliminando assim o Brasil da final. Um chute da Holanda na trave aos 45 minutos do segundo tempo evita o vexame para esta inglória Argentina. O Brasil se autointitulou "campeão moral" da Copa do mundo. Os seres humanos inventam a engenharia genética: um grande passo para a nova humanidade foi a fertilização humana em vidro que gerou a bebê Louise Brown e fez realidade a "lenda das cegonhas" que trazem bebes para quem agora quiser. No Brasil começa a "era Lula", com a liderança nas greves do ABC paulista. A política brasileira jamais seria a mesma nos próximos quarenta anos, sem o entorno do torneiro sindicalista. Apesar do Nobel da Paz , dividido para Sadat e Beguin, dois terroristas que fizeram a paz no Oriente Médio sem pensar nos palestinos, 1978 foi um ano de alegria.

Em 1988 , ano sem copa, ganhamos uma nova constituição federal que rearranja o Estado brasileiro na nossa maneira de nos organizarmos entre nós. Ao mesmo tempo, estoura a greve da CSN em que, zumbis da ditadura militar matam três pessoas. No Chile, o plebiscito diz não a Pinochet que, no entanto, fica ainda mais dois anos, enquanto nos EUA surge a guerreira dinastia Bush. Mas São Paulo faz a diferença e elege sua prefeita socialista Luiza Erundina, aliás, junto com o primeiro campeonato de F1 de Ayrton Senna, ambos resgatam glória ao ano de uma bomba-relógio chamada constituição-cidadã. Ano de tristeza.

A copa do mundo agora é na França em 1998. Lá o Brasil perde a final por três a zero para os donos da casa e, há quem diga, também para a Nike. O Congresso Nacional brasileiro tem sua primeira sessão presidida por uma mulher e , surpreendam-se , a senadora negra Benedita da Silva. A Apple cria o IMAC para nos robotizar, contudo o ibérico, comunista e ateu José Saramago arrebata o premio Nobel de Literatura para a língua portuguesa, no mesmo ano em que Jesus Cristo completa seus 2000 anos, depois das mudanças de calendário que a igreja católica fez e desfez. Ano de alegria.

O jogo está terminando, chego a 2008, um ano bissexto. Foi o ano da maior crise economia norte americana desde 1929, trazendo consigo o presidente Obama, primeiro negro no comando dos EUA , que coincidiu com o ano da renúncia de Fidel Castro, aquele que afrontou o poder militarista e industrial norte americano por quase cinquenta anos. A Google lança o sistema operacional Android e temo que tenhamos nos tornamos um. Ano de tristeza.

É fim de jogo: 2018 ainda está sendo escrito. O Brasil joga neste domingo nos campos russos e, torcemos que também jogue no terceiro domingo de julho, a final. Lula, o líder sindicalista, foi preso, porém lidera as pesquisas de voto para recondução à presidência da Republica brasileira. A democracia está em xeque porque a convicção de uma dúzia de juízes poderá valer mais do que a opinião de mais de trinta e seis milhões de eleitores. EUA e Coreia do Norte tentam a paz. Tem algo nas sombras, já que China e Rússia fazem tratados secretos. O cenário de guerra se mantém entre povos que se fortalecem, enquanto outros, sem admitir, se enfraquecem. Todos estamos sofrendo a tal transformação digital: Deus ri destes seres humanos, com seus simbólicos brinquedos. Se é ano de alegria, ainda não sei. Contudo, sei que queremos mesmo empatar esse jogo neste ano.