A mulher da varanda
A estação, final de outono, aproximação do inverno, o mês, junho, para uma cidade como São Paulo, estas são só mais algumas características para deixá-la mais cinza do que o normal. A madrugada gelada, uma neblina formando luzes multicores na direção das lâmpadas que se confundem com os faróis dos poucos carros. Um silêncio gélido toma conta daquela rua de bairro nobre. No alto de um dos arranha céus , uma mulher, debruçada na varanda, procura sentido para a vida. Não há dúvida que ali não lhe faltam cobertores para se aquecer, não lhe falta um chá quente para os pulmões, mas, prefere a varanda à sua cama aquecida. Dali observa as copas das árvores orvalhadas na pracinha que dá charme à rua. Lembra da importância daquele dia e de quantas vezes fora feliz nesta data: "12 de junho"! Uma lágrima corre a face. Pensa na tristeza dos últimos dias, na saudade de um grande amor que foi embora. Como queria um afago naquela noite fria! Como queria um pé quente para te aquecer! Como queria alguém para dividir um fondue e tomar uma taça de vinho! Existem algumas coisas que não tem graça fazer sozinho! Como queria que aquele dia fosse realmente o dia dos enamorados!
Perdida em pensamentos, observa que ali, ali mesmo naquela na pracinha, na neblina gelada, embaixo das árvores orvalhadas, algo se mexia! Dois vultos. Duas silhuetas. A mulher esfregou os olhos para enxergar melhor aquela cena surpreendente. Como? Como pode ter pessoas ali ao relento? Com esse frio? Acendeu a luz da varanda para melhorar a visão . Não restava dúvida, era realmente um casal.
O homem improvisava uma cobertura com papelões enquanto a mulher estendia um tapete no chão frio. Em seguida tirou alguns panos de uma mochila, cobriu o tapete, que já não era mais um tapete, sim um colchão. Tirou um objeto de uma das mochilas e depois as colocou no lugar dos travesseiros, ao lado colocou o objeto, era um vasinho de flores artificiais, que agora ocupava um lindo criado mudo imaginário.
A cada detalhe, a mulher da varanda esfregava os olhos para ter certeza que tudo aquilo era real. Como pode? Ela é louca? Olha o que está fazendo? Dizia a se mesma.
Agora cama posta, barraca pronta, o casal se abraça comemorando o grande feito. De um saquinho de supermercado, a mulher retira alguma coisa não identificada, sentam recostados nos travesseiros mochilas e ela divide provavelmente o jantar, com o companheiro. Enquanto comem, trocam carícias. Seguram as mãos, trocam beijinhos e sussurram. Em seguida puxam um velho cobertor, se cobrem e deitam agarradinhos num só corpo. Neste momento ele ou ela deve ter sussurrado: eu te amo!
A mulher da varanda, derretendo-se em lágrimas, fala baixinho: Feliz dia dos namorados! Fecha as cortinas e apaga a luz.