A GREVE E A ETERNA SÍNDROME DO HERÓI
 
Diante da greve dos caminhoneiros, o país está quase parado: escolas fechadas, supermercados sem abastecimento, veículos sem combustível e alguns estabelecimentos comerciais fechados. Ontem foi um dia quase morto, como se fosse feriado nacional – mas sem as pessoas passeando de carro ou viajando.

Passando os olhos pelo FaceBook (ontem tive muito tempo livre para fazê-lo) notei, em algumas das postagens, o mito do herói ressurgindo. As pessoas pensam que a greve é por elas, é para salvar o país. Não conseguem enxergar algo simples: que esta greve busca atender às reivindicações de uma classe trabalhadora: a dos caminhoneiros. Enquanto isso, de dentro de suas casas e por trás de seus computadores, as pessoas pedem apoio à causa, explicando que os caminhoneiros estão em greve a fim de mudar a situação do país. Não enxergam uma verdade simples e óbvia: a de que assim que suas reivindicações forem atendidas, os caminhoneiros voltarão ao trabalho. E que a situação do país não vai mudar por isso.

Há também os que pedem o afastamento do atual Presidente – que se não é nada bom, é o que temos no momento, graças à antigas coligações políticas com o governo anterior – sem pensar que, caso isso aconteça, seu vice assumirá o comando. Também se esquece que as eleições serão em breve, e que poderão votar em seu candidato preferido em apenas alguns meses. Mesmo assim, acredito que as eleições não vão mudar a situação do país, porque as pessoas ainda estão desejando encontrar um herói, um salvador da pátria que resolva todos os seus problemas e dificuldades.

Não aprenderam nada. Não percebem que enquanto pensarem e agirem da mesma forma, nada mudará.

O que se vê durante esta greve? Pessoas tentando tirar vantagens pessoais – mercados colocando lá em cima preços de produtos que já estavam estocados antes da paralisação. A mídia falando sobre a falta de medicamentos nos hospitais públicos como se isso não estivesse acontecendo há anos, mesmo sem greve. Partidos políticos e seus defensores tentando tirar a sua ‘casquinha’ da situação, querendo infiltrar-se entre os grevistas em uma atitude suja e oportunista. O povo defendendo a volta ao poder de políticos corruptos e sujos, que se encontram na cadeia. Os ‘inocentes’ em busca de heróis que mudarão suas vidas enquanto eles mesmos nada fazem. Alguns defendendo 'eleições já,'  mas sem saberem em quem votariam ou então votando nos mesmos que depredaram o país e o deixaram nesta situação.

Não mudamos. Não crescemos. Não aprendemos. Estamos fadados a enfrentar situações como a que estamos enfrentando – e outras bem piores -  durante um longo tempo ainda. Não nos lembramos de varrer a nossa própria calçada, mas queremos a rua limpa, enquanto continuamos jogando lixo no chão. Defendemos pessoas nocivas ao país porque elas nos proporcionam vantagens pessoais irrisórias diante do contexto da nação. Tiramos vantagem pessoais de situações caóticas.

Continuamos dando o famoso ‘jeitinho brasileiro’ sem o menor constrangimento, enquanto acusamos os políticos de sua corrupção – sim, esses mesmos políticos que nós colocamos lá e que refletem exatamente o perfil da maioria do povo.
Podem fazer greve, passeatas, protestos; podem ir às ruas e promover quebra-quebras e gritarias, panelaços e acampamentos. Nada vai mudar, enquanto cada um não olhar para dentro de si mesmo e tentar ver o que fazer para melhorar sua própria atitude, tomando responsabilidade pelo que acontece em volta ao invés de continuar procurando por heróis e salvadores da pátria que se aproveitam de nossa preguiça para sugarem nosso sangue.


Ana Bailune
Enviado por Ana Bailune em 29/05/2018
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