Amor em aiuruoca
Seu Tião não sabe onde deixou sua aiuruoca.
Fita o céu nublado através da janela; ele, em sua cadeira de madeira.
Pensava consigo que se lembrara de Johnny Mathis, Net Cole, sua formatura e a dança não dançada, mas não se lembrava onde estava sua aiuruoca.
Na sua inquietude silenciosa, seu Tião, tinha os braços pendentes sobre as pernas, o olhar longe e empedrado, mandíbula pendente e suas costas apoiadas em almofadas.
As melodias lhe viam vivazes em sua mente. Às vezes, um ou outro rosto lhe roubava a distração ao fitar-lhe os olhos...
Não os reconhecia.
Seu Tião não entendia por que sempre lhe chamavam de pai, tio, vô e sempre estavam com o mesmo olhar de "Quem sou eu?"
"Ora, se você não sabe, eu vou saber? -pensava, o impaciente Tião.
Os dias eram assim: "Onde diabos deixei minha aiuruoca?" -esbravejava consigo, seguido de longos períodos de silêncio.
Um belo dia, seu Tião se foi. Amanhecera com um sorriso de paz. Seus familiares acharam em meio a seus pertences uma pequena caixa. Dentro, havia uma pequena aiuruoca e uma foto de Tião e Tina, sua finada esposa. Os dois sob uma cachoeira,, no esplendor da juventude e sorridentes em paixão. No verso, os dizeres:
"Amada Tina,
Lhe prometo ser fiel e lhe amar enquanto eu viver. Sempre, sempre, sempre. Mais e mais.
Case-se comigo! Teremos nossa aiuruoca e viveremos como dois felizes e barulhentos papagaios. Eis o nosso lar.
Com amor, Ti"
Entre lágrimas, a filha de Tião revela:..."Mamãe... no leito de sua morte... chamou por papai.. Fez um afago no rosto dele com sua mão frágil e disse "Te encontro em nossa aiuruoca." e se foi..."
Na tarde do mesmo dia, no jardim da casa, a família foi surpreendida por dois pequenos papagaios de peito roxo fazendo uma tremenda arruaça na copa de um coqueiro.
Construíam uma bela e nova aiuruoca.
Notas:
*Aiuruoca é uma palavra de origem Tupi (Ajuruoka) que traduz Ajuru como ”papagaio” e Oka como “casa”, ou seja, “Casa de Papagaio".
* Aiuruoca é uma bela e mística cidade no sul de Minas e abriga bela vegetação e muiuuitas cachoeiras.
Marcelo Catunda (10/05/2018)