PRAIA GRANDE, MINHA PRIMEIRA COPA.
PRAIA GRANDE, MINHA PRIMEIRA COPA.
A primeira Copa do Mundo a gente nunca esquece. A minha foi na Praia Grande, em 1958.
Onde hoje fica o Restaurante Caiçara, no canto do Forte, aliás, bem no canto, havia um restaurante que pertencera ao seu Gomes, pai de duas grandes amigas de nossa família, Zélia e Celina. Gomes vendera para o seu Augustinho, que ampliara o negócio. A areia da praia ia até o bar e, nos dias de maré cheia, as águas “lambiam” a calçada que circundava o estabelecimento. Diariamente, na parte da tarde, ocorria um futebol de praia arduamente disputado pela rapaziada. Não havia limite de número de jogadores, o tamanho do campo aumentava ou diminuía de acordo com os participantes. Era metade dos presentes para cada lado e, à medida que chegava alguém entrava no jogo e assim ia até o final da tarde. Havia jogo que era tanta gente correndo atrás da bola que não se via a pelota. Sem juiz, muitas vezes saia uns arranca rabo, sem maiores gravidades. A Avenida Marechal Mallet, acesso ao Forte Itaipu, era em uma só pista asfaltada sem guias e sarjetas, ladeada por grandes eucaliptos, cujas folhagens se encontravam, mais parecia um túnel. O Restaurante Lagosta era a referência de comida chique, e quando alguém reclamava da comida a mãe falava: “-Vá comer no Lagosta!”.
O Boqueirão da Praia Grande era um local de um pouco mais movimento, eu comprava revistas de terror em quadrinhos aos domingos. Mas a atração principal era a puxada da rede de pesca. Era uma rede de arrasto, puxada por juntas de bois. Uma extremidade ficava na praia e outra era levada de barco que ia soltando a rede. Não imagino qual o comprimento, lembro que nem se via o barco da praia. Depois de muito tempo, o barco chegava com a outra extremidade e atrelavam-se as juntas de bois. Usavam-se duas ou três juntas em cada ponta da rede e a população ficava aguardando a puxada, muito lenta, com grande expectativa. Após longa espera, o mar na parte interna da rede, mostrava ondulações e, mais um tempo, conseguia-se visualizar, umas barbatanas e alguns peixes saltando. O ponto alto era quando a parte central da rede chegava à beira d´água e podia-se ver claramente o que havia sido pescado. Às vezes muitas surpresas, outras poucos peixes. Lá por 1957 via pela primeira vez uma grande novidade chamada televisão. Com muito chuvisco. Mesmo assim, fiquei admirado de ver em uma pequena tela as pessoas se comunicando. Compras no Armazém do Figuerôa, batizados dos filhos do tenente Aragão. A cada batizado meu pai falava: “-Aragão essa é o último?”. Com uma voz mansa, muito calmo, Aragão respondia: ”-Ainda não compadre Miorim, quero fazer mais unzinho.”. De unzinho em unzinho, Aragão teve uma prole imensa, tudo gente boa.
Belo dia, seu Augustinho instala dois grandes alto falantes tipo corneta na cobertura do restaurante, um direcionado para a rua e outro direcionado para a praia. A finalidade era transmitir a Copa do Mundo de 1958. Daqueles falantes escutei os três últimos jogos da copa. Não sabia muito bem o significado da Copa do Mundo, mas torci muito. A molecada sentava na areia e torcia muito. Uma tensão nervosa muito grande. O narrador, Fiori Giglioti, traduzia toda a emoção da partida e gritava: “- O tempo passa! O Brasil vence!”. E assim foi até os inesquecíveis cinco x dois sobre a equipe da Suécia. Consagração de Garrincha e um garoto de 17 anos chamado Pelé. Foi uma festa. Apareceu uma grande bandeira do Brasil e saímos pela Avenida Marechal Mallet cantando o Hino Nacional Brasileiro, debaixo da bandeira. E dos preguiçosos eucaliptos da avenida. Bons tempos.
Paulo Miorim 15/05/2018