TERROR NA CASA DO CORONEL

TERROR NA CASA DO CORONEL

Quando nos mudamos para o Rio de Janeiro, coronel Walter convidou-nos permanecer provisoriamente na residência de propriedade do Exército em que morava com sua família. A casa era de alto padrão, localizada na Vila Militar, às margens da Avenida Brasil, principal acesso ao Rio de Janeiro. Em 1904, o Rio era a capital do Brasil, e o governo federal iniciou uma grande reforma no Colégio Militar, reforma esta que seria o início da construção da Vila Militar. Com aproximadamente10 quilômetros quadrados, é um bairro amplamente arborizado, com todas as instalações necessárias ao treinamento de tropas desde quartéis com quadras de esporte, colégios, pistas de aplicação com inúmeros equipamentos (pista de aplicação é aquela série de obstáculos que o soldado tem que rastejar, saltar, se dependurar em cordas, etc.) e um grande número de residências para moradia de oficiais. Coronel Walter ocupava uma dessas casas e, como tinha alta patente, era uma das melhores residências. Externamente tinha uma mureta baixa com portão para pessoas e outro para carros Ambos os portões eram de madeira trabalhadas e as peças tinham as extremidades superiores boleadas. A entrada da casa contava com uma boa varanda de aberturas em abóbodas, no interior amplas salas e grandes banheiros. Ao fundo , na lateral da casa, ficava a garagem , com o maior bem material e sentimental do coronel Walter: seu carro. Era um grande carro americano verde, fabricado pela General Motors, da linha Buick, que atualmente não é comercializado no Brasil. Um carrão. As paredes das fachadas da casa eram decoradas com um acabamento em argamassa de concreto tipo escamas com ressaltos que possibilitavam, com minhas mãos infantis, me agarrar e escalá-los. Para desespero de minha mãe. Era só descuidar e lá estava eu literalmente subindo pelas paredes, como nesses paredões que servem de treinamento para alpinistas. Coronel Walter era muito amistoso comigo e ficava apavorado quando me via a dois ou três metros do chão, agarrado na parede.

Numa das paredes havia um registro, que controlava a entrada de água no banheiro do coronel. Curioso, sem querer fechei a entrada de água. Do lado dentro da casa, coronel entra para seu banho . Abriu a torneira, recebeu uma ducha de água que se transformou em lama devido eu ter fechado o registro. Pensa em um homem bravo. Todo sujo, esse coronel gritou até descobrirem a causa do banho de lama.

Aos domingos, Coronel Walter tirava o carro da garagem e dava uma boa manutenção no veículo. Removia as rodas uma a uma, limpava os parafusos gasolina, deitava-se sob o carro e, sempre com gasolina, passava um pano no assoalho por fora. Falava para eu não mexer no garrafão de gasolina que ele deixava ao lado do automóvel, que podia pegar fogo, o que me aguçou sobremaneira minha curiosidade. “Um líquido pegar fogo? Esses adultos não sabem de nada!”, pensei. Esperei o coronel deitar-se embaixo do carro, peguei o garrafão e, com uma caixa de fósforos no bolso, entrei no galinheiro. Espalhei gasolina no chão e joguei um fósforo aceso. E não é que pegou fogo? Era galinha cacarejando pra tudo que é lado, voando pra lá e pra cá. Eu encolhido em um canto, apavorado, pensando na surra que iria levar e como ia sair do galinheiro, pois era fogo de todos os lados. Do nada surge a mão salvador de Dona Zeny, minha mãe. Agarra-me e, heroicamente me salva das chamas. Apanhei mais uma surra como era previsto, o coronel ficou horrorizado com meu vandalismo. Aprendi a duras penas de galinha que gasolina pega fogo.

Paulo Miorim 08/05/2018

Paulo Miorim
Enviado por Paulo Miorim em 08/05/2018
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