Formigas e Humanos

Estava fazendo ginástica e olhando para o chão, onde vi um formigueiro. Fiquei divagando que a sensação de olhar aqueles seres tão pequenos deve ser igual à impressão de Deus, se existir, quando olha para nós, os humanos. Há, na verdade, muitas diferenças e também muitas semelhanças entre a gente e as formigas.

Uma das coisas em comum é que temos uma percepção do mundo muito restrita, geograficamente falando. Tal qual as formigas vivem em seu formigueiro e em áreas de algumas dezenas ou centenas de metros, a maioria das pessoas vive suas vidas em sua cidade e país, que são muito pouco do planeta. Por mais que se viaje, sempre se volta para casa. Pense que há centenas de países, milhões de cidades, milhares de línguas e nada mais do que 7 bilhões de seres humanos. Quem é muito popular vai conhecer no máximo umas duas mil pessoas em toda a vida, ou seja, quase ninguém dos possíveis.

Ambos, formigas e humanos são individualmente insignificantes para o mundo. O mais famoso dos homens, Jesus Cristo, pouco significa para boa parte da humanidade, e em regra alguém na Sibéria ou Uganda nada importa para um brasileiro. Se pouco importamos para a humanidade, também é pequena a influência de quase todo resto das pessoas em nossa vida. Isso não é de todo ruim, porque governos terríveis, crises econômicas mundiais e pobreza nas outras cidades pouco afetam nossa vida. Tal qual o veneno num formigueiro numa rua nada significa para um na outra.

O que nos impacta é o mundinho perto de nós. Para nossas famílias, amigos e colegas de profissão, somos diferentes e especiais. Se estamos tristes, afeta o humor deles, se brigamos afeta suas vidas, nossas festas alegram os outros. É nesse pequeno mundinho que viveremos as paixões, alegrias, tristezas e que importa o que fazemos e sentimos.

Igualzinho às formigas, que são realmente significantes para o formigueiro delas. A comunidade delas depende do trabalho de todas que buscam comida, alimentam os filhotes, protegem o local ou simplesmente geram novos indivíduos. Fora dele, não importam.

Na maior parte.do tempo, as formigas cuidam de. conseguir comida e dos descendentes, ocasionalmente parando por chuvas ou noite.  Nós também passamos a vida trabalhando, às vezes pausando para lazer, doenças, alegrias ou falta de trabalho. Muitas vezes esse lado físico e repetitivo da vida nos aborrece. Mas, curiosamente, é se afundar nesse lado a melhor forma de superar a tristeza de grandes perdas.

Verdade que às vezes o mundo externo pode nos impactar. Acidentes, festas nacionais, jogos de futebol, eventos nos colocam em interação, nem sempre positiva com os outros. Justo igual a uma formiga que ocasionalmente sobe no tênis de alguém e vai parar longe. Mas são pontos fora da curva da vida normal.

Quando fico triste com o mundo, lembro do quão pouco ele mexe em minha vida. Passei pela ditadura militar, depois por Sarney, Collor, Dilma e Temer, pelas recessões dos anos 80, de 2008-2009, pela de 2016-18, passarei pela situação de 2019 também. Ainda que tenhamos Bolsonaro de presidente, sobreviverei. Não porque eu seja especial, e sim porque não dou ao mundo exterior o poder de afetar tanto assim minha vida e de meu grupo familiar. Eu não consigo mudar a realidade geral, entretanto posso influenciar bem minha própria vida. Como cada um de nós.

Quando me chateio com algo de minha vida pessoal ou do momento, lembro o quão grande é a Terra, de quantas possibilidades existem dela estar diferente para melhor adiante. Porque o mundão continuará lá, haja o que houver comigo.

Ser feliz às vezes é mera questão de mudar a perspectiva do que se está olhando.
Paulo Gussoni
Enviado por Paulo Gussoni em 05/05/2018
Reeditado em 06/05/2018
Código do texto: T6328118
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