Ela nunca se apresentava também como proprietária da Suport Informatic. Talvez por medida de segurança, pois, não sabia exatamente a intenção das pessoas que chegam ao  balcão da loja à procura de serviços. Jovens buscam por Lan House nos fundos, de fachada, onde possam fazer apostas e navegar sites pornográficos ou   procuram  informações. Afinal, informação e informática têm a mesma raiz.

Os lábios carnudos da vendedora, contornados com batom mel-avermelhado, tinham curvatura semelhante a dois acentos circunflexos, um com o vértice para cima e o outro com vértice para baixo, ligeiramente abertos, prontos para jogar um beijo. Muitos fregueses retornavam, sob o falso pretexto de fazer levantamento de preços e compravam alguma coisa barata de que não necessitavam. Tudo para ver aquela encantadora balconista, repetir a mesma frase:
Volte sempre...

Nuvens carregadas de amor,  paixão, e medo, guardavam seus segredos e as dores do coração. E dizia à rosa dos ventos que a vida não presta. Que as pessoas são árvores que andam, criaturas artificiais que vivem a mesmice do dormir e acordar. Ou não. A vida é uma tela pintada com estilo e arte, uma paisagem de gente de todas as raças, mulheres de todas as taças à procura de marido. Tudo igual.  
O metrô passava cheio em cada estação: homens de short e camisa regata, outros de terno e gravata, pendurados nas barras do trem como roupas no varal. Ela não pleiteava um herói de pancadaria em  teatro de mamulengos. De modo algum,  invocaria frei Gaspar de Santo Antônio, mas o próprio Santo Antônio casamenteiro de Pádua, para lhe conseguir um marido. E, por  não alimentar sonhos de princesa, queria um casamento simples. Pouca gente à mesa. Poucos convidados e uma banda tocando a ‘Marcha  nupcial. ’  Queria casar-se na noite, na rua, no céu, no mar, na lua,  ainda que fosse com um vesgo ou um galo-de-campina... Ficava horas a fio na igreja ouvindo o sino:
 
 Dim... dão...  Dindão.  Dindãodindãodindãodindão.
 
 O coração  badala  igual sino. Bate o badalo, toca o sino, bate o coração-menino. E no soar do sino, o santo casamenteiro lhe promete um par para o coração. Tudo era tão triste... A cidade, se lhe parecia uma selva de concreto por onde  caminha  rebanho  de ovelhas sem pastor. Gente de todas as raças, mulheres de todas as taças, miúdas e pequenas, trafegam ligeiro em muitas direções. Multidões de veículos  deslizam velozes no negro asfalto. Adiante, um assalto põe a vítima em histérica gritaria. Ninguém para. Só espia. Tudo passa apressado na janela da existência, e já não  se tem tempo sequer para um bom-dia ou como vai. A noite cai e guarda em sua sombra a  Pedra da Gávea. Ravenala esperava que antes da quinta estação Deus lhe desse um par para seu coração.
 
***
Adalberto Lima, trecho de "Estrela que o vento soprou."
Imagem: Google