A aridez como verdade
Em Graciliano Ramos sempre o menos é mais. Nos livros Angústia, Vidas Secas e São Bernardo o mínimo de metáforas e evocação de imagens transmite o máximo de sensações e emoções. O ascetismo do estilo revela o jeito rude do sertanejo, ou a insofismável crença no lucro do fazendeiro, ou o ódio e o rancor do homem do interior que se adapta à vida na cidade. Fabiano, de Vidas Secas, é, a um só tempo, bicho e homem. O narrador de São Bernardo não tem valores morais, é egoísta e materialista. Luís da Silva, de Angústia, é empurrado do interior para o movimento da cidade, deprimido e frustrado.
“Nunca pude sair de mim mesmo”, diz o autor em entrevista. Existem obras – literárias ou artísticas – que explicam o homem. No caso de Graciliano é o contrário que ocorre. O que de mistério poderia existir no homem, ficou reservado para seus romances. Homem que se retira para a cólera, solitário, fugidio. Nele se estabelece que na obra artística ou literária, só o ódio cria...
Sua concisão e rigidez foram tão longe em seus escritos, que se destacou do regionalismo. Foi além do modernismo também. Foi clássico sem rebuscamento e sem artificialismo. Pode existir enlevo nessa aridez? Só como pode existir transcendência no zen, fazendo uma comparação esdrúxula para muitos ouvidos... No zen o menos é mais e, como o próprio Buda dizia, ao ser perguntado se tinha ganho algo em meditar, colocava: “Não ganhei nada. Mas deixe-me dizer o que eu perdi.” Perder a avidez, a raiva, o medo, a preguiça não é tarefa fácil e uma via negativa, como no budismo, é quase sempre, ato de intelectuais... Intelectuais como Graciliano e seu universo forte, violento, claro e verdadeiro, ao mesmo tempo.
Apreciar tamanha grandeza não é para todos... Mas pode ser para muitos... O que hoje em dia poder-se-ia chamar de minimalismo, não poderia estar mais distante do autor. Graciliano Ramos adotou o preto e branco, o monocromático em sua literatura – rica nessa própria contenção – mas não fez concessões à beleza estética do sofisticado. Ao contrário, sua desesperança e pobreza são feias, como é feia a realidade e a sua verdade. Apreciar tal nível de clareza não é para todos... Mas pode ser para muitos... A aridez da verdade não seduz, mas também não ilude e não engana.
Este ícone da literatura brasileira e mundial muito ainda tem a nos ensinar. Sobre a vida, sobre a morte e sobre tudo o que se tem em conta da sensibilidade e da falta dela. Necessidade tão premente nos nossos dias.
Mauricio Duarte (Divyam Anuragi)
Referências bibliográficas:
A verdade e a mentira . Novos caminhos para a literatura . Léo Schlafman . Editora Civilização Brasileira . Rio de Janeiro . 1998
The Search . Talks on The Tem Bulls of Zen . Bhagwan Shree Rajneesh . Rajneesh Foundation . India . 1977
Nem água, nem lua . Bhagwan Shree Rajneesh fala sobre dez histórias zen . Bhagwan Shree Rajneesh . Editora Pensamento . São Paulo . 1975
Em Graciliano Ramos sempre o menos é mais. Nos livros Angústia, Vidas Secas e São Bernardo o mínimo de metáforas e evocação de imagens transmite o máximo de sensações e emoções. O ascetismo do estilo revela o jeito rude do sertanejo, ou a insofismável crença no lucro do fazendeiro, ou o ódio e o rancor do homem do interior que se adapta à vida na cidade. Fabiano, de Vidas Secas, é, a um só tempo, bicho e homem. O narrador de São Bernardo não tem valores morais, é egoísta e materialista. Luís da Silva, de Angústia, é empurrado do interior para o movimento da cidade, deprimido e frustrado.
“Nunca pude sair de mim mesmo”, diz o autor em entrevista. Existem obras – literárias ou artísticas – que explicam o homem. No caso de Graciliano é o contrário que ocorre. O que de mistério poderia existir no homem, ficou reservado para seus romances. Homem que se retira para a cólera, solitário, fugidio. Nele se estabelece que na obra artística ou literária, só o ódio cria...
Sua concisão e rigidez foram tão longe em seus escritos, que se destacou do regionalismo. Foi além do modernismo também. Foi clássico sem rebuscamento e sem artificialismo. Pode existir enlevo nessa aridez? Só como pode existir transcendência no zen, fazendo uma comparação esdrúxula para muitos ouvidos... No zen o menos é mais e, como o próprio Buda dizia, ao ser perguntado se tinha ganho algo em meditar, colocava: “Não ganhei nada. Mas deixe-me dizer o que eu perdi.” Perder a avidez, a raiva, o medo, a preguiça não é tarefa fácil e uma via negativa, como no budismo, é quase sempre, ato de intelectuais... Intelectuais como Graciliano e seu universo forte, violento, claro e verdadeiro, ao mesmo tempo.
Apreciar tamanha grandeza não é para todos... Mas pode ser para muitos... O que hoje em dia poder-se-ia chamar de minimalismo, não poderia estar mais distante do autor. Graciliano Ramos adotou o preto e branco, o monocromático em sua literatura – rica nessa própria contenção – mas não fez concessões à beleza estética do sofisticado. Ao contrário, sua desesperança e pobreza são feias, como é feia a realidade e a sua verdade. Apreciar tal nível de clareza não é para todos... Mas pode ser para muitos... A aridez da verdade não seduz, mas também não ilude e não engana.
Este ícone da literatura brasileira e mundial muito ainda tem a nos ensinar. Sobre a vida, sobre a morte e sobre tudo o que se tem em conta da sensibilidade e da falta dela. Necessidade tão premente nos nossos dias.
Mauricio Duarte (Divyam Anuragi)
Referências bibliográficas:
A verdade e a mentira . Novos caminhos para a literatura . Léo Schlafman . Editora Civilização Brasileira . Rio de Janeiro . 1998
The Search . Talks on The Tem Bulls of Zen . Bhagwan Shree Rajneesh . Rajneesh Foundation . India . 1977
Nem água, nem lua . Bhagwan Shree Rajneesh fala sobre dez histórias zen . Bhagwan Shree Rajneesh . Editora Pensamento . São Paulo . 1975