É preciso permanecer fechado...
Hoje, passeando pelas avenidas dos meus pensamentos, Sentei-me naquele velho banco de lembranças, hoje já desbotado pelas tantas intempéries. Aqui eu venho muitas vezes, adoro o cheiro de recordações deste bosque de desatinos. Agora já não tão badalada como fora outrora. Lembro-me desta praça quase sempre estar cheia, vi passear por aqui os mais deslumbrantes sentimentos. Eram robustos, fortes! Eu parava por horas, apreciando a desenvoltura de cada um deles. Por onde andarão?
Eu tinha o costume, na verdade quase uma rotina, eu ia, de esquina à esquina, nas entrelinhas das minh’alma. Conhecia cada pedaço meu, costumava mapear pontos críticos, visitá-los com mais frequência, plantar sementes de ousadia, ver a planta crescer, garantir sombra àquela parte cansada em mim. Quem sabe eu tenha perdido o tempo, em fazer todas estas coisas. As árvores foram derrubadas, despedaçadas, não restou se quer vestígios ao chão frio do meu porfiar. Não é exatamente ruim não conhecermos as pessoas, o ruim mesmo, é quando passamos a não nos reconhecemos mais. As mudanças são válidas, desde que não mudem nossa essência. Eu permiti tantas visitas, deixei a porta do meu coração tão escancarada que foi inevitável, não ter milhões de emoções furtadas. Meus jardins estão pisoteados, algo próximo a devastação, um desmatamento de esperança. Mas não fechei minhas portas para sempre, não! Não! Existem sim muitas pessoas má intencionadas, que estendem a mão para acolher e, logo após te explorar de alguma forma. Todavia existem outras que te acolhem,te presenteiam, te ajudam, pelo simples fato de enxergar no outro, a própria imagem naqueles momentos em ela também precisou e, não teve quem o fizesse por ela.
Minhas portas estão fechadas sim! Mas para remover os entulhos de decepções, para que ninguém veja que eu por um tempo desmoronei. Afinal, os que foram tempestades em mim, provavelmente desejam exatamente isso, ver as minhas ruínas. Mas não meus caros! Eu irei me reconstruir, ornar minha alma de flores, proteger-me dos temores, que fizeram tantos outros sucumbirem. As primaveras virão, ainda há muito o que fazer, nem tudo em mim foi sitiado, e mesmo que fosse, eu não me permitiria viver entre as cinzas. Não! Já basta a escuridão em que muitos vivem por aí mundo a fora. Revitalizarei minhas avenidas de “bem querer”, reconstruirei minhas praças de sentimentos, meus bosques de intentos. Erguerei muralhas em volta de mim, não estou me fechando para o mundo, apenas dificultando os acessos à mim. Os que se achegarem a mim, só permanecerão se houver neles, o desejo de desbravar-me. Dado o momento em que vivemos, é óbvio que muitos não se esforçarão para isto, logo, não passarão dos portões de entrada.
Eu não posso afirmar que não amarei, porém não quero sentir o que estou sentindo. É o início de um voo solitário onde não terei lugar para pousar. E, ficar fora de mim, para aventurar-me em lugares vazios, não é bem o que eu quero agora. Até que eu reconheça-me novamente em toda a minha essência, ficarei aqui reconstruindo meus muros, minhas fontes, minhas origens, meus sentimentos… Meu Eu, outrora despedaçados por causa de voos não planejados, em mundos vazios de emoções.
(Hámilson Carf)
#Devaneios