A vida dos outros
Conheci a morte algures, numa estrada fechada, dessas ruas inundadas de trevas, sem policiamento.
Nas viagens da vida, desolado e perdido, sem preocupação nenhuma nos bolsos, só uma mala de problemas me pesava nas costas, a mente fora de órbita, um enjoo sem esforço lembrou-me o sorriso da Ana e a comida lá em casa.
Quis guardar minha podridão amorosa, pelo menos por um dia, mas a ordem desorganizada desses sentires sempre controlou meus passos. A depressão já me havia seguido até a paragem, fiquei esquecido do luxo que transportava e perdi-me a contemplar o vácuo da cidade.
Por um lado a carranca que incitava uma reunião familiar, por outro o estilo ensimesmado de respirar que deixa Deus cabisbaixo. Não sei para quê vieram, mas me queriam matar. Não lhes bastava tirar de mim tudo que me atiçava o ar.
Monstros com máscaras de humanos, vivem para matar, roubam de quem trabalha, seu trabalho é roubar. Um capuz, um descaramento e rudeza, fechando todas as saídas para fuga, todo o espaço de defesa. A curiosidade dos bandidos apagou os sonhos dum crente e fez-lhe voltar ao zero, sem identidade.
Ficou apenas minh´alma e uma invisível caixa de problemas que trouxe mais areia para esse camião, cujo parachoque é uma sucata de dilemas. E assim como aconteceu comigo, eles acabam com a vida dos outros, devolvem pessoas trabalhadas à sarjeta e nada se resolve.
Fica apenas a corrida alienada à busca da existência e a espera pouco paciente da personalidade roubada, pensamentos adoecem a fragilidade mental e nascem traumas, mortes lentas sem funeral.