O papel da imprensa
Nós todos, principalmente os do tempo do onça, temos uma noção clara e até abrangente, do papel da imprensa. E o papel a que me refiro é esse moderno papiro. Ou seja, físico, geralmente branco, onde se imprimem notícias, comentários, opiniões, fotos, reclames, etc. Há exceções quanto à cor, que vim a tomar conhecimento só bem mais tarde, como por exemplo é o caso da Gazzetta dello Sport, do Financial Times, do Il Sole...
A recordação mais remota que tenho é de ver o Batista, da fábrica de tecidos do Brumado em meados da década de 50, exibindo a sua cópia do Estado de Minas, de que se comprazia em ser assinante, e de comentar com papai para manter o velho ao corrente dos acontecimentos. E curiosamente, não consigo ainda alcançar a razão, uns tempos depois, ainda no mesmo empoeirado e algoado povoado do Brumado, minha tia Vicentina, por um breve tempo, tornou-se assinante daquela mesma publicação, que à época era de formato bem mais largo e comprido do que o padrão de hoje em dia.
Tia Vicentina, empregada rasa da fábrica não lia nem ao menos as manchetes do jornal, que vinha pela Rede Mineira da Viação, e no entanto guardou alguns exemplares por um bom tempo. Minha intuição, que ainda espera achar esclarecimento cabal para a questão, é que a assinatura deu-se por instrução de papai, irmão de Vicentina, numa circunstância de expectativa da publicação de algum ato oficial que beneficiasse a classe operária. E olhem que Getúlio já havia morrido por essa época. Juscelino, mais afeito aos mega-projetos de desenvolvimento, e menos à causa obreira, é que governava então.
Decorridos pelo menos seis décadas do episódio, vem-me à caixola a real utilidade do jornal que embrulhando um corte de coxão duro, serviu para mamãe ter uma visão quanto ao meu futuro, ali naquela tarde ensolarada e fresca de junho ou julho de 1975: com a bela estampa de uma moça de Belo Horizonte, seguia-se uma entrevista sobre o êxito da moça no ano anterior para o acesso à carreira diplomática, bem como a chamada para as inscrições no ano que corria.
Eu que andava descrente com as oportunidades de magistério e mesmo de pos-graduação nas Letras e na Geografia, em que me havia recém-formado na Universidade Federal de Minas, bem como com o preço da gasolina já suplantando o da cerveja, e nunca havia pensado na diplomacia, embarquei na provocação de mamãe, não sem antes cumprir um estágio breve num curso de preparação para controlador de tráfego aéreo em São José dos Campos...Mas o meu voo era para Brasília mesmo. E para o mundo.
E ao menos uma vez, para mim, a imprensa cumpriu seu papel.