LAGARTIXAS NA PAREDE

Lagartixas na parede silenciosas testemunham o ir e vir de quem não sabe para onde ir. Apenas observam e nada fazem por alguém que nunca lhes deu a mínima; o mesmo alguém que hoje decidiu importuná-las com filosofia de quinta.

Enclausuradas em vida, jamais compartilharão, lá fora, das frustrações de quem persiste em viver lá fora. Então aguardam, no seu egoísmo de silêncios, para jogarem na cara do alguém que elas não estarão nem aí quando este mesmo voltar-se para dentro de casa, para dentro de si.

Nunca se saberá se riem, se se entristecem, ou se permanecem impassíveis diante dos sentimentos do alguém quando este os demonstrar. E não há por que ele ficar acanhado em demonstrá-los. Afinal, não passam de lagartixas.

No entanto, elas o veem... Então ele questiona que se nem mesmo pode ocultar as mais nobres ou as mais sórdidas ações e reações dentro de seu próprio lar, este na qual julga ser o lugar mais seguro para ser quem é de verdade, existe algum lugar neste mundo que lhe seja realmente seguro?

Ele começa a temer as lagartixas, elas que sabem de tudo e "aparentemente" nada fazem. Tem coisas que ele não quer revelar para ninguém, e quando ele diz ninguém é realmente ninguém. Nem mesmo lagartixas suspensas em paredes.

Parado por um instante, o alguém cogita tornar-se confidente das lagartixas, já na certeza de que esse negócio não dará certo. Pois lagartixas em paredes não podem lhe dar conselhos quando ele precisar de conselhos. E simplesmente não pode ordenar que se retirem quando precisar ficar sozinho. E no momento, ele precisa ficar sozinho.

O alguém quer entrar em seu quarto e trancar a porta, enquanto seus parentes estão fora, viajando. Ele quer sorrir para o nada e também derramar lágrimas, quantas forem necessárias, enquanto rumina alguns passados, rabiscando seus segredos nas páginas do diário. Ele quer ser ele mesmo enquanto está sozinho, porque está farto de tentar ser o que não é quando está lá fora. Ele quer tantas coisas...

Mas há quem não lhe dê privacidade, sonsas criaturinhas suspensas em paredes, prontas para lembrá-lo de que no mundo exterior não existe privacidade. Pois quem a quer, precisa aprender a guardá-la dentro de si, ou demonstrá-la a quem se comporta como lagartixas, que tudo veem, mas não se intrometem no que é alheio.