Meu Tipo Inesquecível
Estávamos no início da década de 60. Casado há poucos anos, havíamos ido morar em João Pessoa, para onde eu havia sido transferido. Fase difícil, pouco dinheiro, vivíamos contando as moedas. O salário não dava pra chegar ao fim do mês, quanto mais para comprar algumas coisas essenciais que ainda nos faltavam. Foi nesta época que conheci o meu Tipo Inesquecível (estou tomando emprestado este termo, que dava nome a uma página da revista Seleções).
Conhecido e admirado por todos, tinha por norma ajudar às pessoas a resolverem seus problemas, fossem quais fossem. Se alguém precisava de algo ele de pronto dizia: - Isso não é problema. A gente faz!
Logo ficamos amigos e compadres, sou padrinho de um dos seus filhos. Tínhamos interesses e gostos comuns, e nos frequentávamos aos finais de semana. Meu conceito de inteligência mudou logo que nos conhecemos, pois, a pessoa era um verdadeiro exemplo do “homem dos sete instrumentos”.
Era músico, corneteiro no quartel onde trabalhávamos, e tocava violão de um jeito simples que nos contagiava. Foi nessa época que inventei de aprender a tocar este instrumento, onde, apesar de muitas tentativas não consegui evoluir.
Ficou sabendo que estávamos querendo uma mesinha de centro para usar no terraço e logo ouvimos o bordão: A gente faz! – E fez. Uma linda mesinha com uma imagem estilizada da fachada do Palácio do Planalto, perfeitamente entalhada, usando madeira de duas cores, um trabalho de profissional. E se alguém falasse em pagamento ficaria ofendido.
Tempos depois foi a vez do sofá. Alguns pedaços de madeira conseguidos sem custo, dois sacos de açúcar vazios, as molas de colchão velho já sem uso. Só tivemos que comprar o tecido para cobrir e lá estava o sofá que nos serviu por uns bons dez anos.
Tínhamos uma cama de solteirão, toda em jacarandá da Bahia, com um espelho bem alto, como era moda nos móveis antigos. Em dois tempos ele a transformou em duas camas de solteiro que deixaram minha sogra muito feliz quando as dei de presente. Os dois colchões de mola também fizemos em casa em dois finais de semana. E pagamento? Nada. O fato de ser espírita talvez explique um pouco tanto desprendimento. E foram muitas as demonstrações de sua habilidade e inteligência incomum. Vou deixar algumas de lado e pular para a que mais me surpreendeu.
Vieram aqueles dias de inflação desenfreada, quando os preços subiam todos dias, até mais de uma vez. Quem tinha algum dinheiro ficava apavorado vendo seu valor desaparecendo a olhos vistos. Era preciso empregar em alguma coisa imediatamente. Minha cunhada me pediu para comprar um fusquinha usado e eu fiz um péssimo negócio. O motor prestes a “bater” me impedia de passar o carro para frente, e pela enésima vez ouvi: - A gente faz!
E fizemos, em dois finais de semana. Consegui vender o carro logo em seguida, e desta vez ele teve que aceitar, muito a contragosto, uma gratificação pelo serviço.
É por estas e outras que o compadre Antônio Vieira da Silva sempre será o MEU TIPO INESQUECÍVEL.