ESTOU FORA. FUI!
Propomos discutir a disponibilidade para o outro. Até que ponto deve existir uma disponibilidade mútua entre pessoas? E para quantos amigos e conhecidos podemos nos disponibilizar? Afinal quanto menos dedicação- a tantos que nos cercam- mais é possível garantir um pouco de quietude que chamamos de bem-estar propiciado pelo distanciamento dos contatos que, em demasia, desequilibram o emocional. Deixem-nos sós! Não queremos mais isso.
Quando somos jovens muitas pessoas nos elogiam e podemos não dar importância a esta questão. Mas, envelhecendo e perdendo os olhares e assédios costumeiros à juventude tudo fica mais claro. Há mutações e enfrentamento das carências, por isso precisamos do "olhar do outro" sobre nós. Um olhar mais terno, mais atento que marque a "delicadeza" do tratar bem. Um sacar nas entrelinhas onde todas as coisas estão à flor da pele. Trata-se de ganhar maior consciência da "alteridade" . A ausência do olhar, do sentir que acompanha um elogio estampa a rejeição ou indiferença que uns têm pelos outros.
Não falamos de assunto inútil. O caso é mais sério do que parece. Não estamos preocupados com aparências. Não se trata de querer que os outros nos achem bonitos ou nos observem com roupas novas. Não é isso e nem é só um problema de carência afetiva. Não elogiar também é um menosprezo ao alheio visto apenas como companhia circunstancial pronto para escutar. Um quebra-galho da solidão.
É curioso observar a comunicação pelo FACEBOOK mostrando uma euforia padronizada em que todos são forçados a exibir certo narcisismo, sempre afirmando beleza, amor, felicidade ao se apresentarem em rede. É um biombo que ajuda a ocultar o vazio e o falso nos contatos humanos. Dizem os analistas, que tem causado mal-estar, quando expõe as viagens e um padrão ideal de integração familiar. Talvez que este tipo de euforia seja tão deletério quanto buscar alguém como substituto de genuína amizade. Quem sabe as centenas e milhares de seguidores nas páginas destes veículos virtuais não sejam um antídoto para substituir o desejo dos holofotes vivido pelas celebridades?
Melhor é suprir nossas carências flanando nas ruas das grandes cidades, abertos à surpresa do encontro com desconhecidos talvez mais plenos de sentimentos e bons fluídos. Não custa nada tentar e ter fé na humanidade já que para o bem ou para o mal somos todos gregários. O anonimato das ruas diminui o fluxo das neuroses entre prosadores. É a válvula de escape daqueles sem poder aquisitivo para terapias de apoio. Curtir os encontros esporádicos, refletir sobre os ganhos e perdas do momento vivido são mais que suficientes para preencher o vazio existencial causado pelo protocolo das relações formais . Em síntese , a rua é o espaço em que nos livramos das obrigações institucionais e das pessoas que nos cercam no cotidiano.
Dizia um poeta grafiteiro carioca que "gentileza atrai gentileza". O dístico ganhou os muros da cidade e pegou fama nos carnavais. Pena que acabou virando caso folclórico. Hoje em dia, tendemos a concordar com o jornalista José Simão preocupado em relatar as ocorrências que fortalecem o "deboche" sobre a crença de que " o brasileiro é um povo cordial".