Restaurante vitrine

Eu prefiro restaurantes com vidraças. Vidros limpos, transparentes. Vidros que me permitam olhar, ver muita gente comendo, mastigando, sorvendo molhos deliciosos, cortando carne, batata, ralando os ossos de um galeto nos dentes. Gente lambuzando-se nas sobremesas, nos sorvetes e nas tortas. Como é bom comer. Preciso ver gente comendo, mastigando e arrotando. Humanos comem e eu também sou humano. Poderia ser eu naquela mesa, naquela outra ou naquela mesinha ali no cantinho, comendo um sanduíche suculento de pernil. Poderia ser eu. Não é incrível? Eu sou espécie humana e faço parte desta humanidade toda. Pena que este meu delírio da fome dure tão pouco. Entre mim e eles sempre haverá um vidro e alguém fazendo sinal para que eu saia imediatamente da paisagem da rua. Eu me iludo com a comida deles e eles se iludem com a paisagem da rua. A rua é a minha casa, minha fome, minha miséria. Posso não estar visível na janela ou na porta do restaurante, mas estarei sempre aqui do outro lado da vidraça. Eu sou a paisagem. (Walter Sasso - Autor do livro "Soca Pisada" - Amazon)