no clima do amor
Se escrevesse eu morreria de tédio, quer dizer, exatamente o contrário seria um tédio e até mesmo loucura EU não escrever, inda que seja um grande e insignificante nada. Mas como é bom! Terapêutico, na falta dum termo menos clichê. Eu hoje pensei que pudesse viajar, estive em dúvida entre voar até Mendoza na Argentina ou embarcar num cruzeiro a bordo destes navios colossais cujo itinerário partia de Santos, atravessava toda a costa do litoral paulista ancorando em Ilha Bela, da ilha, o Costa Favolosa aportaria no Rio de Janeiro. Será muito bom pra mim, tentam me convencer meus conselheiros, respirar novos ares, conhecer pessoas diferentes, sair deste quarto cheio de livros velhos, são prescrições que me são dadas neste momento de treva. Procurei no grande dicionário Aurélio palavras novas em nossa língua portuguesa e o oráculo léxico confidenciou-me a palavra díptero – “que tem duas asas” ora ora quão bom agouro tem a metáfora do anjo, um anjo sempre trará luz porque este meu díptero virá do Alto, do Céu, Enviado da Luz.
Caso pudesse fazer uma inconfidência aos vizinhos do andar de baixo, que não suportam barulhos de móveis arrastando, crianças correndo ou músicas em alto volume, não importando o gênero, e que me bajulam porque sou um vizinho muito discreto que sabe respeitar o ocaso de um casal septuagenário, não os importunando em suas leituras religiosas, mas quanto a inconfidência, eu ia dizendo, lhes segredaria que escuto no volume máximo In the Mood for Love em meus modernos fones auriculares posicionados ergometricamente em torno de meu crânio, esta confidência sempre me surge mentalmente quando os encontro no elevador, ela me faz sentir um revolucionário rebelde ou até mesmo, pasmem! um vizinho desregrado que não ama a humanidade.