O QUE ESTAMOS ESPERANDO?

Nascemos numa sociedade em que os valores invertidos parecem normais. Ouvimos dizer que o Brasil é um país que já nasceu morto, contaminado pela podridão da colonização caracterizada pela violência justificada pela ganância e obstinação da obtenção de riquezas e poder. Seria esse o motivo de estarmos ainda vivenciando um dos mais preocupantes cenários de violência conhecidos pela humanidade?

Nossos índios foram massacrados, “catequizados”, enganados, roubados e empobrecidos. Perderam suas terras, suas raízes, suas culturas, enfim toda sua riqueza intangível. Os negros que aqui chegaram de pés descalços e de corpos pelados, foram pelos poderosos escravizados, na maioria assassinados. Seria esse o motivo da prevalência de assassinatos contra homens e mulheres negros em nossas cidades?

As guerrilhas que aqui tivemos, as lutas que enfrentemos, as vidas que desde então perdemos e os direitos que não alcancemos, nos trazem a sensação de que não temos nação e, que na busca por uma igualdade, somos vistos sempre às margens da sociedade, reprimidos com brutalidade pelos detentores da legalidade. Seria esse o modelo de justiça que o pobre trabalhador, pai e mãe de família, jovens e crianças da cidade e do morro, esperam de nossas autoridades?

As classes que vêm se formando, as mulheres que estão se expressando, os negros gritam mais alto, os gays que descem dos saltos, os índios que tiram suas tangas, os hippies que deixam as miçangas e as crianças que não rodam cirandas, procuram a expressividade e a repulsa da exclusão na sociedade em busca de mais liberdade, justiça e tranquilidade. Seriam essas as causas pelos quais milhares de pessoas perdem suas vidas no país das oportunidades?

O bandido que atira de cima, a polícia que ataca por baixo, o sangue que escorre do morro, o povo que pede socorro, a voz que não é ouvida, a morte por bala perdida, a criança que não vai a escola, o mendigo que pede esmola, o pai que fica desempregado, a mãe que trabalha dobrado e o governo se faz de coitado, o país mais sucateado com um caixa todo quebrado. Seria esse o país que os brasileiros, dos que ainda nele acreditam, sonharam um dia deixar para a posteridade?

A política emana poder, o dinheiro faz o olho crescer, a ambição atropela a moral, no país do futebol, da novela e do carnaval. As notícias são tendenciosas, nossas músicas são maliciosas, a inocência é voluptuosa numa prostituição vergonhosa, incentivada pelo prazer daqueles que deveriam nos proteger. Seria essa a riqueza cultural que nossos filhos e netos terão que conviver para macular as perversidades?

A morte é abrupta, a polícia que mata, a política corrupta, a justiça pro rata. Uma morte encomendada, uma autoridade disfarçada, uma ativista assassinada. Os valores invertidos, para calar os oprimidos, essa corja de bandidos, se fazendo de amigos, nos colocando em perigos. Proteger a vida humana, não deveria ser profana, mas hoje é coisa insana. O prêmio da proteção é a bala no coração, a morte e um caixão. Como ainda não bastassem, os incultos a culpassem, não é vítima é vilão, seu papel de cidadão, teria sido em vão?

Os nomes não vou citar, pois os anos irão passar e um dia irei retomar a leitura desse manifesto. Queira eu ter uma surpresa, que a vida vermelha verdeja e o povo na rua festeja a vitória do bem contra o mal, num mundo onde o amor é o normal. Mas se isso não acontecer, a esperança não vamos perder, pois a sina do justo é vencer. Aí teremos a certeza de que as vidas ceifadas, a vozes caladas, as pessoas trancadas, a luta lutada, não foi tudo em vão. E quando esse tempo chegar, pode até demorar, vamos todos aclamar.

Paulo Roberto Fernandes
Enviado por Paulo Roberto Fernandes em 17/03/2018
Reeditado em 21/04/2018
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