É...

Não gosto do amanhecer. Gostaria que a noite fosse eterna. Acordar cansado e ter que se levantar para ir cansar o corpo e a mente, novamente, por exemplo, é uma das coisas tristes mais engraçadas.

Porque no final do dia será a mesma coisa: Nem tudo, ou mesmo nada, correu como o desejado. Você pode até ser vidente ou andar por aí a premonizar os acontecimentos da tua vida, porém, quando chegar a hora, serás surpreendido pelo estranho realizar-se das coisas.

Se você espera receber dinheiro, ou os multibancos ficam desfuncionais, ou os próprios bancos ficam sem sistema, ou então a pessoa que lhe devia falece. Não literalmente, por vezes. Fica completamente incomunicável. Para quem tem a vida mergulhada em créditos, é mais um teste de bondade, é provação na certa. Se espera ter aulas, ou os professores não dão a cara, ou aparecem mas entram na sala de aulas e não dizem nada de jeito. Sente-se tão perdido no meio de colegas que não sabem o que querem, no meio de conversas sem assunto, num universo de faculdades que desviam a mente jovem.

Você está quase sempre em andamento e a cabeça não conhece outra estalagem senão a lua, tem os pés em terra mas algures, ao mesmo tempo, tem-se a tempo inteiro. Trata todas as questões por serem resolvidas como problemas e o maior de todos é a fome. Não, a pobreza, que não permite matá-la. É uma viagem longa até chegar a casa e ainda existirem formas de guardar o apetite e acumular o vazio estomacal para quando lá estiver. A não ser que queira mandar para fora o seu perfil batalhador e mendigar.

Rasgar as vestes e sentar-se no chão, ser ignorado, pois é o que acontece com quem pede esmola.

Aturar chamadas e responder mensagens que deixam o clima nublado mesmo com o sol a arder, ter que andar atrás de pessoas para que alguém depois não fique atrás de si com repúdio, ficar calmo e aceitar que pouca gente (ninguém) lhe poderá entender. Ter que ser manso e proporcionar conversas amigáveis com quem lhe quer desvendar alguns segredos.

Ter que responder às saudações encouraçadas com porquês. Mas você só quer é ter de volta o sono não dormido.

Há trabalho a ser feito e meios necessários para tal, mas como se trata de serviços que só ganham desfecho com a inteira colaboração duma outra parte, é esta que dificulta o andamento das coisas. No fim, um trabalho inacabado porque alguém não respondeu aos emails, não atendeu nenhuma chamada e ignorou as mensagens de texto. Alguém não quis ser entrevistado na hora e ficar com o seu contacto é mais um peso nas costas. Ligar e ligar e receber tantas voltas.

Ir ao escritório e produzir conteúdos noticiosos. A internet é das boas, mas o que dá raiva são as matérias à toa que, por serem assim, precisam de ser colmatadas, mas por vezes são mesmo à toa demais.

A cabeça está com febre que carregou, desde a universidade, as ideias já não fluem devidamente, a fome não se quer calar e o sono aproveita a lentidão e entra em acção.

Pensamentos sujos, desejos estranhos, coragem e paciência é preciso. Nenhuma mensagem de amor. Mas também só traria mais ainda o mau-humor. Você só quer é receber uma mensagem de convite pra comer. Tantos compromissos duma vez, mas dizem que é a vida. Tédio!

Grande parte dos eventos são infectados pela irresponsabilidade horária, realidade antiga e imutável.

Você faz um esforço e organiza o material, se preciso acende um cigarro para ter que lidar com mangonhas e a enchente das grandes personalidades, membros do Executivo e seus cabolas, dentre outros... Estes começam apenas quando a paciência já bateu o limite e você se vai embora, sem lhe ter sido permitido, muitas vezes, uma foto ou um "talking" rápido com quem quer que seja que esteja na linha da frente.